“A elevada taxa de vacinação comprova que os portomosenses aderiram à vacina”

Autor: | 8 Out 2021

Quase oito meses depois da abertura do Centro de Vacinação de Porto de Mós e numa altura em que o processo está prestes a entrar numa nova fase, estivemos à conversa com Renata Inácio e Sílvia Venda, as enfermeiras que têm sido o rosto mais visível de uma vasta equipa constituída por enfermeiros, médicos e funcionários do Município, à qual os portomosenses não têm poupado elogios.

Qual o balanço que fazem destes quase oito meses de trabalho do Centro de Vacinação de Porto de Mós (CVPM)?
Sílvia Venda – É bastante positivo, começando logo pelo facto da Câmara se ter aliado à nossa equipa. Termos feito este trabalho em parceria foi muito benéfico para a população e fez com que as coisas resultassem da forma que resultaram. Em termos de organização não seria possível à Saúde, sozinha, toda esta dinâmica, não teríamos nem espaço nem recursos para dar resposta a esta vacinação massiva.

A parceria tem sido, então, bastante positiva?
Renata Inácio – Sim, não me recordo de nada que possamos apontar à Câmara. Sempre que algo foi solicitado tentou dar resposta e houve uma grande abertura para acolher as nossas sugestões quer ao nível do espaço, quer de recursos humanos. Só temos a agradecer porque aqui [no Centro de Saúde], era difícil montar toda aquela estrutura. Há também que enaltecer e agradecer aos funcionários do Município que têm trabalhado no CVPM porque não era a sua função, tiveram que se adaptar e agarraram a missão como sendo sua e muito se esforçam durante a semana, ao sábado e aos feriados sem saberem se num dia contamos com 100, 500 ou 1000 pessoas. Temos muito a agradecer-lhes.

O facto dos funcionários não serem da área da Saúde dificultou alguma coisa?
Sílvia Venda – Não. Resultou muito bem. Penso que conseguimos fazer com que sentissem que faziam (e fazem) parte da equipa e o sucesso está precisamente aí, o termos conseguido integrá-los e trabalharmos todos muito bem em conjunto.

Podemos dizer que são quase que uma família, tendo em conta o excelente relacionamento entre todos?
Renata Inácio – Sim, os funcionários da Câmara eram pessoas que ou não conhecíamos ou que conhecíamos mal e graças a este trabalho fomo-nos conhecendo e estreitando laços. Estando a trabalhar nisto há meses e de forma intensa se não tivéssemos esta grande ligação poderia haver o cansaço, o deteriorar das relações, às vezes uma resposta menos agradável, mas, felizmente, as coisas têm funcionado bem, elas (e eles) esforçam-se imenso. É ambição de todos, quando for possível e permitido, fazermos um jantar ou algum tipo de convívio.

Foi difícil montar toda uma estrutura do zero uma vez que não havia este tipo de experiência?
Sílvia Venda – Não. No início, além do Centro de Porto de Mós, optámos por ter pólos em Mira de Aire, Juncal e Marinha da Mendiga porque achámos que para a população mais idosa seria benéfico. É claro que isso implicou um esforço adicional em termos de organização e de logística mas naquela altura fez todo o sentido. Tínhamos de andar “com a casa às costas” quase todos os dias mas valeu a pena.

Vacinar centenas de pessoas num único dia presumo que coloque uma certa pressão sobre os vossos ombros. Tem sido difícil gerir isso?
Sílvia Venda – Há momentos em que se torna mais difícil mas talvez os funcionários do Município o sintam com outra intensidade porque nós, enfermeiros e médicos, estamos habituados a trabalhar sob pressão. Se calhar já trabalhámos em situações muito mais no limite que isto, casos de vida ou morte mesmo.

Têm trabalhado muito mais horas e, inclusive, aos fins de semana e feriados. De que forma é que isto veio mexer com a vossa vida pessoal e familiar?
Renata Inácio – Eu tenho uma bebé pequena e já contava sentir dificuldades quando regressasse ao serviço mas não estava à espera que fosse tão difícil, ter que dar tanto ao trabalho e que isso prejudicasse tanto a nível familiar. Não tinha a noção nem vinha preparada para tanto. De facto, foi-se intensificando esta necessidade de permanecermos cá mais tempo e por isso temos de agradecer às nossas famílias porque se não tivéssemos um grande suporte familiar não teria sido fácil e esperemos que esta falta em casa e os momentos que deixámos de viver com os nossos filhos não se repercutam, no futuro, no seu desenvolvimento. Temos de viver com essa mágoa no coração e eu, no meu caso, tento gerir da melhor forma mas não é fácil.

O CVPM é dado como exemplo na região. Qual é o segredo do vosso sucesso?
Renata Inácio – Eu penso que é o facto de todos terem agarrado muito esta missão, não foi só um ou dois, fomos todos e se era preciso ficar até mais tarde, ficávamos todos. Não sentimos que alguém nos fechasse as portas. É para avançar, avançamos. É para convocar mil pessoas para amanhã, então convocamos. Não havia muito o “hoje não posso”, houve sempre alguém para ficar.

Por que é que começaram com quatro centros e há vários meses têm apenas um em funcionamento?
Sílvia Venda – Os centros fora da sede de concelho foram criados a pensar nas pessoas mais idosas. Entendemos que uma boa estratégia seria vacinar estas pessoas nos seus sítios de referência porque muitas têm dificuldades de locomoção ou precisam do apoio dos filhos. À medida que fomos baixando de escalão etário percebemos que não faria sentido manter os polos a funcionar uma vez que se tratavam de pessoas com uma mobilidade bastante maior. Além disso, com o aumento diário de vacinas havia centros que já não tinham capacidade para acolher tanta gente e como os utentes mais velhos já eram muito poucos decidimos centralizar as coisas de forma a conseguirmos dar resposta aquilo que nos estava a ser exigido.

Em alguns momentos conseguiram atingir mais cedo determinados números ou ir além das metas traçadas. Isto deixa-vos orgulhosas?
Renata Inácio – Sim, de facto eram-nos definidos números mínimos para vacinar por dia e nós começámos a contactar mais do que nos era proposto. Fizemo-lo com o objetivo de acelerar a vacinação e porque percebemos que conseguíamos fazer mais que aquilo que nos era colocado como meta.

Neste momento qual é a percentagem da população do concelho de Porto de Mós já vacinada?
Renata Inácio – Temos 91% da população vacinada com a primeira dose. O objetivo é chegar ao final de setembro e ter o mínimo de 85% como a task-force solicita. Faltam 1100 pessoas por vacinar no concelho neste momento [dados são referentes à primeira quinzena de setembro quando foi realizada esta entrevista].

Os portomosenses aderiram bem ao processo de vacinação?
Sílvia Venda – Aderiram. Tivemos uma boa participação que está refletida na taxa de vacinação. Na faixa etária dos 50 aos 30 anos as pessoas demoraram um bocadinho mais a chegar até nós e a explicação que temos é que os utentes sabiam que nós, neste Centro, convocávamos as pessoas por telefone e não por SMS e ficaram à espera que as convocássemos. Só que, entretanto [por indicação da coordenação nacional] começou-se a dar prioridade ao modelo de auto-agendamento e aí deixámos de fazer contactos telefónicos ou os que fazíamos eram quase residuais porque era só para elaborar a lista de suplentes, ou seja, as pessoas a chamar caso alguém que tivesse marcação feita falhasse. Algumas queixavam-se que estavam a ser passadas para trás em relação aos mais novos mas o que se passou é que a idade dos auto-agendamentos foi baixando e estas continuaram à espera que fossemos nós a convocar.
Renata Inácio – Neste momento temos alguns na faixa etária dos 20 aos 30 anos que recusam ser vacinados.

E os mais novos têm aparecido?
Renata Inácio – Sim, têm aparecido. Dos 12 aos 18 anos a taxa de vacinação é muito alta, temos tido muita adesão. Nessa, a percentagem de recusa é muito residual.

Têm recebido muitos elogios mas, certamente, também ouvem críticas. Do que é que as pessoas se queixam mais?
Renata Inácio – Os principais reparos foram relativamente à dificuldade em fazer o auto-agendamento. Houve uma fase em que nem nós tínhamos explicação para o facto de estarmos a vacinar pessoas com 18 anos e haver outras com 40 anos que tentavam fazer o auto-agendamento e o sistema não o permitia. Eu se fosse uma delas também não ficaria satisfeita. Tivemos ainda quem sem ter recebido a SMS de confirmação, se apresentou no Centro na data a que se tinha proposto ser vacinada e depois não o pôde ser porque não estava no agendamento para essa data. Tudo questões a que éramos alheios.

Nos quatro centros houve registo de reações adversas à vacina na altura da toma?
Renata Inácio – Não. Tivemos apenas um rapaz que precisou de ir ao hospital porque caiu e bateu com o braço, mas nada a ver com a vacina.

Prevê-se que os Centros de Vacinação encerrem em breve e o processo passe para os Centros de Saúde. Como é que veem essa solução?
Renata Inácio – Tendo em conta que, neste momento, estamos a vacinar cerca de 200 pessoas por dia, quase tudo segundas doses, não se justificará ter um espaço dedicado e tanta gente a trabalhar para vacinar um número tão pequeno. Julgo que as duas unidades existentes conseguem absorver esse número, até porque daqui a duas semanas as tais 200 pessoas serão 30 ou 40.

Durante este processo quais foram os principais problemas com que se depararam?
Sílvia Venda – Eu penso que não tivemos muitas dificuldades e as que surgiram fomos conseguindo ultrapassá-las.
Renata Inácio – O processo de vacinação por estar em constante evolução traz alguma imprevisibilidade: há regras que hoje estão em vigor e que amanhã já não estão e por vezes damos uma resposta a uma pessoa que horas ou dias depois poderá já estar desatualizada. Pode parecer que não sabemos o que andamos a fazer mas não é o caso. As regras e as prioridades são estabelecidas a nível superior e nós, localmente, apenas temos de as cumprir e por isso vamos adotando as práticas e o discurso conforme as indicações que recebemos.

Se tivessem que caracterizar as pessoas que já vacinaram diriam que a maioria estava nervosa ou com medo?
Sílvia Venda – Tensas sim, com medo, não. Podem chegar algo ansiosas mas não amedrontadas. Se formos a ver, as classes etárias mais novas são as mais apreensivas. Os mais velhos já passaram por tanta coisa que têm tendência para encarar a vacina apenas como mais uma das coisas da sua vida. De qualquer forma, tentamos sempre tranquilizar uns e outros e falar desta vacina como uma outra qualquer, portanto, como algo perfeitamente normal.

Têm sido muitos os elogios ao trabalho do centro de vacinação vindos tanto de autarcas como do cidadão comum. São um bom afago de alma?
Renata Inácio – É sempre bom ouvir elogios a reconhecer o nosso esforço e sacrifício. Não o fazemos para os ouvir, nem para as palmas que nos são dadas, fazemos para o nosso descanso pessoal e para a nossa consciência estar tranquila pelo que fizemos, mas de facto sabe sempre bem ouvir, é um incentivo. Não é o objetivo principal, tentamos pôr-nos à margem deles, mas claro que também somos seres humanos e gostamos de ouvir palavras agradáveis.