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Canábis junta avó e neto na confeção de sapatilhas

30 Novembro 2020
Catarina Correia Martins

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Catarina Correia Martins

30 Nov, 2020

A comunicação social regional e nacional tem dado, nas últimas semanas, destaque a um projeto peculiar: avó e neto criam uma empresa que fabrica e comercializa sapatilhas de canábis. Bernardo Carreira, o neto, é de Mira de Aire e Otília Santarém, a avó, de Minde, no concelho de Alcanena. A empresa, com o nome 8000Kicks, criada em 2019, tem sede em Mira de Aire e uma sucursal nos Estados Unidos, onde está a maioria dos seus clientes.

A O Portomosense, Bernardo Carreira, de 27 anos, explicou que a ideia surgiu num «brainstorming entre amigos»: «Tinha-me despedido do meu trabalho e queria começar um projeto. Tinha muitas ideias, andava a fazer brainstormings, a visitar fábricas, colegas em lojas de Lisboa… Numa noite, houve um amigo que disse “Fixe era fazermos um sapato de canábis” e eu, na altura, respondi que era uma ideia um bocado estúpida, mas que até podia fazer algum sentido, porque já tinha visto carteiras e malas feitas de canábis», conta. Bernardo Carreira decidiu ir falar com a sua avó. Quando lhe perguntámos porquê a avó, foi perentório a responder que «uma avó é sempre uma avó, está sempre pronta a ajudar» e, naquele caso em específico, tinha a vantagem de «ter mais de 50 anos de experiência em têxteis e confeções», o que é «muito importante e foi essencial». Otília Santarém, de 77 anos, «não achou muita piada», as palavras são do neto que, em jeito de brincadeira, afirma que quase foi posto «fora de casa» e que a avó o avisou para não se «meter nas drogas».

«Eu encomendei o tecido, expliquei do que se tratava e ela lá me ajudou. Seguiram-se meses de amostras, desenvolvimento, escolha de tecidos e construção dos sapatos», lembra. Em maio de 2019 era, então, lançado oficialmente o projeto que hoje tem um modelo de sapatilhas, disponível em duas cores, e um modelo de máscara. A produção, «na parte final de montagem dos sapatos», era, inicialmente, feita em Portugal, porém «na altura do primeiro confinamento, toda a gente deixou de fazer sapatos e começou a fazer máscaras», o que fez com que durante seis meses a empresa estivesse «sem fabricar». «Foi péssimo», atira Bernardo Carreira, CEO da 8000Kicks. Para evitar que o mesmo volte a acontecer, decidiram começar «a trabalhar também com uma fábrica na China, para diversificar o risco». A matéria-prima, o cânhamo, que de acordo com Bernardo Carreira é a «parte industrial do canábis», é importada de várias zonas do mundo: França, Roménia, China e, «às vezes», Canadá.

Portugal “acha piada” mas compra pouco

Montar um negócio deste tipo, para Bernardo Carreira, «é “partir pedra” todos os dias»: «Neste momento, o desafio não é como arranjar o canábis, mas como vender os sapatos, tendo em conta que as pessoas têm muito menos poder de compra e menos disponibilidade financeira», explica. Cada par de sapatilhas custa cerca de 100 euros e o CEO diz saber que «em Portugal, toda a gente acha imensa piada» ao conceito, mas há que «respeitar o facto de estarmos numa pandemia e de os portugueses terem um poder de compra mais baixo». Os países onde vendem mais são os Estados Unidos da América, o Reino Unido, a Alemanha e o Canadá, mas têm também pedidos de países como a Mongólia, o Zimbabué ou Angola.

Bernardo Carreira aponta, no entanto, que o preço das sapatilhas se justifica pela «qualidade e durabilidade do produto». «Só fazer a nossa palmilha, que é única, feita de canábis, super confortável, custa mais do que a maioria dos sapatos de marcas muito conhecidas que vemos nas lojas de desporto», explica. Porém, considera que, quem compra, «tem aquilo que paga: o conforto, a leveza, o facto de ser sustentável e a durabilidade do canábis, que é muito resistente».

O cânhamo, a matéria-prima usada pela 8000Kicks, «era usado para fazer as cordas e as velas dos descobridores portugueses, nas naus», afirma, acrescentado que é «super resistente», mas que hoje conhece-se ainda outra vantagem: é eco-friendly, ou seja, amigo do ambiente. «O cânhamo consome cinco vezes menos água do que o algodão, que é uma das fibras mais populares do planeta; não requer pesticidas nem inseticidas para crescer; também absorve dióxido de carbono e ajuda a restabelecer os nutrientes do solo», refere. É por isso que, para Bernardo Carreira, este material tem um «potencial que se tem estado a perder nos últimos tempos» e que pode ser «a fibra do futuro».
O CEO aponta ainda outro fator diferenciador da sua empresa e dos seus produtos: «Quando as pessoas apoiam o nosso projeto, sabem que não estão só a comprar um par de sapatos, estão a trabalhar connosco e nós respondemos às mensagens. Esta comunicação direta é uma coisa única que não existe em muitas outras empresas», refere. Esse é um ponto que, na sua ótica, é reforçado pelo facto de as vendas serem online, diretamente para o cliente, sem qualquer loja como intermediária. Para Bernardo Carreira, assim é possível garantir que «a experiência é cinco estrelas e o “passa-palavra” tem sido uma das maiores fontes de crescimento».

No futuro, o objetivo é «lançar novos produtos e novas cores», mas «com calma» para «garantir que cada produto tem o selo de qualidade»: «Preferimos ter menos produtos e garantir que os clientes estão satisfeitos, se não não vale a pena andarmos aqui. Ou é para mostrar que o cânhamo é a fibra do futuro e fazer produtos superiores ou, então, mais vale estarmos quietos», conclui.

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