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Cancelamento das Festas de São Pedro leva associações a lutar pela sobrevivência

20 Maio 2020
O Portomosense

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O Portomosense

20 Mai, 2020

Sem grande surpresa. Foi desta forma que as quatro associações ouvidas pel´O Portomosense e que costumam marcar presença nas tradicionais tasquinhas das Festas de São Pedro, em Porto de Mós, reagiram ao anúncio do cancelamento da edição deste ano. A decisão, motivada pela pandemia de COVID-19, é vista de forma unânime como tendo sido a mais acertada e que procurou dar prioridade à saúde pública. Não obstante isso, o momento em que souberam da decisão que era vista por muitos como inevitável foi marcado por mágoa e tristeza, que se deveu não só à interrupção na participação de um evento considerado de extrema importância, mas também por saberem que se avizinham tempos difíceis.

A participação nas Festas de São Pedro era vista por muitas das coletividades como um “balão de oxigénio” para a sua sustentabilidade. «As festas são uma importante fonte de receita da associação, na ordem dos 40%, e agora, sem essa verba, vai ser difícil continuarmos com a mesma coisa se não encontrarmos outras formas de financiamento», adianta Carlos Vieira. O presidente, há mais de 20 anos, da União Recreativa Desportiva Juncalense, não prevê um futuro fácil mas garante que não vai baixar os braços perante esta adversidade. «Levámos, de certa maneira, um tiro que nos vai abalar um bocado, mas não estamos a pensar em suspender nada. Sabemos que vai ser um ano difícil e teremos que fazer um esforço muito grande para conseguirmos continuar com as atividades», desabafa.

Há largos anos que o clube dirigido por Carlos Vieira tem marcado presença em competições oficiais mas esta época havia uma equipa dos escalões de formação que ia participar numa taça nacional, pela primeira vez. Um feito que a pandemia tornou num sabor agridoce. «Tenho pena dos miúdos que conseguiram esse objetivo. O coronavírus, de certa maneira, impediu-os desse sonho», refere.

Onze quilómetros separam o Juncalense do Centro Cultural Recreativo Dom Fuas, mas nem por isso a realidade que aí se vive é distinta. Muito pelo contrário. A coletividade com morada na Fonte do Oleiro também já tem consciência dos impactos que advêm do cancelamento das Festas de São Pedro. «Vai-nos atingir muito porque era lá que tínhamos os rendimentos para poder suportar toda a atividade desportiva do clube e para fazer algumas obras, caso aparecessem», refere o presidente, Alexandre Inácio. Este ano, além de ver a «maior fonte de rendimento» escapar-lhe por entre os dedos e uma série de outras atividades onde conseguiriam fundos, o encerramento do bar do clube também não ajuda nas contas ao final do mês. «Tínhamos previsto algumas obras que já tivemos que cancelar», adianta.

Agora, o desafio do clube é manter as duas equipas de futsal, masculina e feminina, num total de 30 atletas. «Nós não suspendemos nada. Vamos continuar com as equipas que tínhamos e tentar arranjar fundo de maneio para conseguir aguentá-las», refere Alexandre Inácio. Para isso, esperam poder contar com o apoio do Município e da Junta de Freguesia de Porto de Mós.

Coletividades prevêem redução de apoios

A lacuna deixada pela ausência das Festas de São Pedro é transversal às várias coletividades que tinham como garantido o montante que, anualmente, amealham no decorrer do evento. Em conversa com O Portomosense, Manuel Nazaré, presidente do Rancho Folclórico da Cabeça Veada, afirma que apesar de haver sempre a necessidade de ter que pagar a uma cozinheira para trabalhar nas festas, ainda «sobravam sempre entre 7 a 9 mil euros». Num contexto normal, por esta altura, as «cerca de 50 pessoas» que compõem o grupo já tinham começado as atuações com o rancho. Em contrapartida, hoje cada um está confinado em sua casa, sem ensaiar desde março e com a perspetiva de que este ano já não fará mais nenhuma atuação.

O período de paragem não é, contudo, sinónimo de inexistência de despesas. «Além da água, luz e telefone, para o ano vamos ter que investir em mais trajes porque a gente mais nova cresce», desabafa. Para colmatar essas necessidades, Manuel Nazaré está a contar com o apoio considerado imprescindível da Câmara e da Junta, apesar de já saber que «não será bem igual». «Não podemos deixar que o São Pedro e os ranchos acabem, porque deram muito trabalho a criar e a manter», sublinha.

Se no passado, coletividades como é o caso do Rancho Folclórico da Cabeça Veada tinham o privilégio de receber apoios de empresários locais, a partir de agora a realidade poderá ser bastante diferente. «Este ano, a crise é tanta que eu não sei até que ponto me acho com coragem de ir chatear as pessoas. As dificuldades existem para nós, como para eles», constata. Com 70 anos, Manuel Nazaré vai às tasquinhas de Porto de Mós desde a sua abertura. Uma tradição que já foi transportada para o neto que com apenas 10 anos, estava a «começar a viver o São Pedro». «Tenho dúvidas que tudo volte a ser como era, mas temos que ter fé em Deus», antecipa.

Sem a “grande fatia do bolo”, associações fazem contas à vida

Para os Bombeiros Voluntários de Mira de Aire, a notícia do cancelamento das Festas de São Pedro não podia ter vindo em pior altura. Com a aquisição de um carro de fogo, no passado mês de janeiro, o dinheiro que haviam de conseguir este ano nas Festas seria para acabar de o pagar. «É uma grande fatia do bolo. As tasquinhas são para nós, como se fosse pão para a boca», garante António Rosa, presidente da associação humanitária. No decorrer do evento anual, a associação conseguia reunir «entre 10 a 11 mil euros», dinheiro que é, normalmente, gasto na «compra de equipamento» e que em 2019 serviu para comprar uma ambulância. Sem São Pedro, é com algum ceticismo que o responsável olha para os próximos tempos. «O contributo das Festas é um balão de oxigénio para a associação e a não acontecerem, haverá um impacto muito negativo», refere.

Com o país a atravessar uma luta desigual contra a COVID-19, vários serviços prestados pelos bombeiros foram cancelados, desde fisioterapia a transporte de doentes, e por isso, a associação faz agora contas à vida. «Cada vez que sai alguém para uma urgência tem que ir equipado e quando chega ao quartel deitamos tudo fora, quer a pessoa esteja infetada ou não e isso custa-nos 30 euros», explica. Apesar da corporação ter vindo a ter o apoio do Município de Porto de Mós, das Juntas de Freguesia de Mira de Aire e de Serro Ventoso, e ainda a ajuda de várias empresas do concelho, António Rosa adianta que a Liga dos Bombeiros está em articulação com o Governo a tentar encontrar uma solução que permita fazer face às despesas que se vão avolumando e que poderá passar por «uma espécie de empréstimo a pagar por daqui a um ou dois anos, sem juros», adianta.

Até amanhã, altura em que se inicia a época de incêndios, os bombeiros estão a trabalhar em espelho para que «não haja nenhuma situação desagradável na associação». Apesar de o foco hoje estar no combate à pandemia, António Rosa pondera ter que dividir os homens que dão resposta às urgências e aqueles que estão destinados ao combate de incêndios para assim, impedir a propagação da doença.

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