O folhear de jornais antigos traz-nos sempre muita coisa à memória. Como diria alguém, é nas páginas de O Portomosense que está escrita a história recente do concelho de Porto de Mós.
Obviamente, não temos a pretensão nem vontade de nos substituirmos aos historiadores, muito menos recorremos ao método que utilizam. Fazemo-lo de outra forma e com preocupações e objetivos diferentes, mas não tenho dúvidas que o muito que registamos será de grande utilidade a quem, mais tarde, quiser contar a nossa história coletiva. Se outra utilidade não tivesse, o nosso trabalho serviria, pelo menos, como testemunha de um passado recente, um repositório daquilo que de mais importante se passou no concelho desde 1983 a que se junta muita outra documentação e escritos que nos remetem para um passado bem mais remoto.
“Escrevemos” a história do concelho mas acabamos por construir a nossa própria como instituição e, claro, como jornalistas e como pessoas. Pode não parecer, porque escrevemos sobre tanta coisa (e, por vezes, para quem está de fora, com alguma aparente frieza) mas tudo aquilo que noticiamos, tudo aquilo que acompanhamos, todas as pessoas com quem nos relacionamos nesta atividade, tudo isso acaba por fazer parte de nós, moldar também a nossa própria história enquanto profissionais e cidadãos.
Há dias, ao pesquisar um determinado trabalho tive de folhear edições antigas de O Portomosense e, por acaso, deparei-me com um editorial que me fez recordar muitas coisas, umas boas outras más. Pôs-me também a fazer contas, bem simples, por sinal, mas cujo resultado não deixou de me surpreender. Daqui a menos de duas semanas completam-se 19 anos desde que escrevi o meu primeiro editorial, ainda, na altura, como diretor-interino. Para o cargo de diretor fui convidado cerca de dois anos depois com a saída do meu antecessor, mas sejam 19 ou 17 anos, são, de facto, muitos anos à frente de um projeto tão exigente.
É impressionante como o tempo voa. Se me perguntassem se tinha ideia que era há tanto tempo responderia, com verdade, que não. Confesso que sou péssimo a guardar datas na memória. Este “esquecimento” tem um aspeto positivo. Parece significar que apesar das muitas tormentas já passadas o saldo, em termos pessoais e profissionais, é, no meu entender, positivo. É certo que muita coisa poderia ter corrido melhor, tinha tudo para correr melhor, mas as coisas são o que são e temos de saber viver com o que temos a cada momento e tudo aquilo que foi bom compensou o que correu menos mal.
Há uns tempos, alguém, aqui na redação, dizia que nesta profissão somos uns privilegiados tendo em conta os momentos que acompanhamos, as estórias que relatamos, as pessoas que vamos conhecendo, os conhecimentos que vamos fazendo e que nos tornam, a cada momento, “especialistas” de tudo e de nada porque se hoje escrevemos sobre a vespa asiática, amanhã sobre novas regras do futsal, e no dia seguinte acerca dos programas comunitários de apoio, o osso de dinossauro que foi encontrado, ou do campeonato de carrinhos de rolamentos… Sim, é verdade, somos uns privilegiados, ficamos mais ricos como pessoas e como profissionais. Adquirimos experiência, vivemos momentos únicos, conhecemos uma imensidão de gente que nos acrescenta muito, outra que nem por isso mas é com uns e outros que temos de fazer o nosso trabalho da melhor forma que sabemos e podemos.
Durante este longo período fiz bons amigos, conheci muita outra gente boa e interessante mas, claro, há quem “não morra de amores” por mim e outros que, aposto, me têm como inimigo de estimação. Como se costuma dizer, faz parte. Uns e outros fazem parte do nosso percurso e do nosso trabalho e é essa mensagem de não se conseguir nem ser desejável agradar a todos que tento transmitir às pessoas que trabalham comigo e aos muitos estagiários que já me passaram pelas mãos. A natureza do nosso trabalho é impeditiva de agradar a toda a gente. Se isso acontecer é porque ficamos nas meias tintas e o jornalismo não se faz de meias tintas, é o que é, mesmo que por causa disso tenhamos de desagradar alguém, seja um ilustre desconhecido ou uma pessoa que nos é próxima por algum motivo.
Olhando para trás, valeu a pena, tem valido a pena? Sim, penso que sim. Não tem sido fácil, tem havido momentos particularmente difíceis até, mas folheando as páginas deste jornal sinto que temos feito verdadeiro serviço público e isso é que interessa. É bom vermos o nosso trabalho reconhecido, dá alento, mas se estivermos dependentes ou à espera de elogios é melhor mudar de área. O sentimento do dever cumprido é, sim, o que realmente interessa, e esse tem estado bem presente.
Isidro Bento