Equipa de setas do CCRD Arrimal “lança” freguesia além fronteiras

20 Abril 2023

Jéssica Silva

Posicionar, focar, apontar, lançar. A sequência pode parecer fácil mas exige mestria e concentração, sobretudo quando se quer fazer um arremesso perfeito contra o alvo. Falamos de dardos ou simplesmente setas, uma modalidade desportiva que há mais de 14 anos se pratica na sede do Centro Cultural Recreativo e Desportivo (CCRD) de Arrimal mas que, apesar da popularidade mundial, ainda continua a não ser levada muito a sério por cá.

Este desporto surgiu no clube pela mão de um grupo de quatro amigos que, sem sequer saberem jogar, aproveitaram a chegada de uma máquina de dardos para se juntarem e formarem uma equipa. Hoje, a modalidade é praticada por uma equipa de sete elementos, com idades entre os 21 e os 50 anos, sendo que apenas dois são do Arrimal. Hugo Henriques, de 32 anos, atual jogador, era um dos que fazia parte desse grupo e conta que tudo começou «como uma brincadeira»: «Tínhamos quatro pessoas, o número que era preciso, e fizemos a equipa. Mantivemos sempre a nossa postura, o nosso compromisso, não faltávamos a um jogo», avança. Aquilo que começou por carolice, rapidamente se transformou e ganhou outras proporções. Sem que tivessem previsto, logo no primeiro ano, a equipa passou à fase final do campeonato, um presságio do que seriam os anos seguintes. «Desde que a equipa foi criada, temos tido sempre jogadores nas fases mais importantes das setas», garante. À equipa do CCRD Arrimal, juntou-se, pouco tempo depois, Luís Duarte, de 49 anos e natural da Maceira, que já tinha experiência de jogar noutro clube. «Hoje em dia temos o “bicho”, a febre de jogar. Entramos em quase todas as competições, a nível nacional [onde chegam a jogar 700 pessoas] e até já fomos ao estrangeiro», frisa.

A crónica falta de reconhecimento

Apreciada por uns, menosprezada por outros, esta modalidade continua a não merecer a devida atenção por parte da sociedade. Esta é a opinião de Hugo Henriques que dá exemplos práticos que sustentam essa mesma ideia: «Temos jogadores desta casa que participam todos os anos nas finais nacionais, onde estão os melhores jogadores de Portugal. Temos, inclusive, um rapaz, que apesar de não jogar aqui é como se jogasse, que já foi campeão nacional. Temos jogadores que já foram a competições internacionais e as pessoas nem sabem disso», lamenta. Apesar da ausência de reconhecimento, o jogador acredita que a modalidade já trouxe visibilidade à freguesia: «Muita gente conhece o Arrimal porque já vieram cá jogar em torneios. Somos adorados em todo o lado, porque também sempre os recebemos cá bem», conta.

À exceção de dois ou três anos, o CCRD Arrimal tem conseguido sempre manter em funcionamento pelo menos uma equipa de setas ou até mais do que uma (como aconteceu na época passada) com vários escalões de competição. Ao longo destes 14 anos, já passaram pelo clube, jogadores de vários lugares como Maceira, Alcanena, Minde, Leiria, Amiais e Rio Maior. Alguns acabaram por desistir, outros dispersaram-se para outros clubes mas não foi o caso de Hugo Henriques, para quem as setas são o seu desporto, quase como um modo de vida. «Jogo todos os dias com o entusiasmo de há 14 anos e tento sempre melhorar para chegar mais longe», assume, com visível orgulho.

“Jogadores novos não aparecem todos os dias”

Tal como noutro qualquer desporto, também a prática de dardos tem benefícios: «As setas já me trouxeram muito conhecimento, são uma modalidade didática, na qual temos que ser rápidos, fazer contas e aperfeiçoar a matemática». Por outro lado, o jogador de setas fala sobre o ambiente por detrás deste desporto, onde, garante, se vive «uma união fantástica» e se conhece «imensa gente». «Não conheço outro desporto assim em termos de união», frisa. Apesar das vantagens, a verdade é que são poucos os que querem praticar a modalidade e os que decidem experimentar são muitas vezes «puxados por outros». «Jogadores novos não aparecem todos os dias, como na “bola”, no atletismo ou nas bicicletas. Vai aparecendo um por ano – quando aparece – com muito sacrifício e depois também é um bocado difícil criar equipas competitivas com poucos jogadores», explica.

Esta escassez de praticantes está relacionada com diversos fatores, um deles, Hugo Henriques considera que se deve ao facto de muitos «não quererem assumir o compromisso»: «Nem toda a gente está disponível. Há pessoas que até gostavam de experimentar mas depois pensam “lá vai o sábado perdido” e preferem ir para a festa». Outra das razões, acredita, prende-se com a ideia errada de que essa é uma modalidade que envolve muitos custos, por haver a necessidade de «meter uma moedinha na máquina». «Qualquer miúdo gosta de jogar, só que nunca houve muito o estímulo de os puxar para as setas e, às vezes, os pais nem querem que eles se aproximem da máquina. Se fizermos as contas não é como se pensa, as pessoas é que criaram essa ideia porque não têm conhecimento. Se forem à sala do outro lado, está lá um alvo – trazido pela equipa – que podem utilizar para jogar sem terem que pôr uma moeda», refere, acrescentando que está a ser pensado um workshop para dar a conhecer a modalidade.

O jogador de dardos descarta a ideia de que este é um desporto caro e dá o exemplo de outras modalidades que envolvem custos muito maiores: «Nós fazemos atletismo, temos que comprar uns ténis e se calhar passado três meses temos que comprar outros. Compramos um trio de setas, custam 40 ou 50 euros, e é capaz de durar cinco ou sete anos». «É verdade que temos que pagar para jogar. Pagamos os apuramentos mas o campeonato não. Quem fizer parte equipa do CCRD não tem que gastar nada, tem que aparecer ao sábado e jogar. A associação paga o jogo», garante.

Aos que estejam a ponderar integrar a equipa de setas do CCRD Arrimal, é aconselhado que experimentem primeiro para perceberem se gostam da modalidade e se têm jeito. Para isso, basta aparecem na sede do clube, num qualquer dia da semana, depois de jantar. É certo que nessa altura irão sempre encontrar alguém a jogar. Se pensa que não tem perfil para a prática da modalidade, esqueça essa ideia. Hugo Henriques defende que qualquer um pode jogar, sem que para isso tenha que possuir alguma característica específica: «Podemos ter o melhor jogador do país em Porto de Mós e ele nunca pegou numas setas», garante.

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