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Equitação terapêutica: terapia que é também distração

4 Abril 2020
Jéssica Moás de Sá

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Jéssica Moás de Sá

4 Abr, 2020

Quando perguntámos a Ana Varela, gerente do Centro Hípico de Alcaria e também técnica de equitação terapêutica se nos podia falar do trabalho que desenvolve há 15 anos nesta área, a sua resposta foi instantânea: «É daquelas coisas que só se entende, experimentando». E por isso, aceitámos o conselho e fomos até ao centro hípico perceber de que forma esta terapêutica pode beneficiar utentes com diferentes patologias.

Engane-se quem pensa que o que fomos fazer foi simplesmente andar a cavalo, porque esse não é o pressuposto da equitação terapêutica. Todo o trabalho de preparação e limpeza do cavalo é também essencial e por isso completámos todas as etapas: fomos buscar o Carnaval, assim se chamava o cavalo, ao seu estábulo, limpámos e colocámos todos os adereços necessários para estar pronto para ser montado. Ana Varela explica a importância destas tarefas: «Assim nós conseguimos desenvolver a relação com o cavalo e através de todos os movimentos para o limpar estamos a treinar o corpo, a motricidade e a coordenação de uma forma muito simpática, onde podemos sentir o cavalo, o pêlo, as texturas e o seu calor. Só o facto de nos relacionarmos com o cavalo traz por si só diversos benefícios, quer a nível físico, quer a nível cognitivo e psicológico». A limpeza gera também um sentimento de «responsabilização» para com o cavalo mas também consigo mesmo, percebendo a importância destes cuidados.

No Centro Hípico de Alcaria, as patologias para as quais são mais procuradas estas terapêuticas são «a paralisia cerebral, autismo e trissomia 21, assim como algumas perturbações gerais de desenvolvimento, hiperatividade, défice de atenção e pessoas em estado depressivo», embora existam mais patologias identificadas. Em termos genéricos a terapêutica destina-se «a indivíduos portadores de necessidades especiais, seja qual for a sua idade, desde que não apresentem nenhuma contra-indicação à prática da equitação».

Diferentes patologias requerem diferentes abordagens, explica Ana Varela. Pessoas em que as patologias são mais físicas aplica-se mais a hipoterapia que tem objetivos «neuromotores específicos e prioritários no processo de reabilitação do indivíduo», retirando «contributos de reabilitação através do movimento do cavalo». Já a equitação terapêutica pode ser mais vasta, tendo objetivos «psicomotores, direcionados para necessidades especificas na área educacional, psicológica ou cognitiva», sendo necessária uma equipa multidisciplinar, onde o treinador de equitação trabalha em conjunto com outros intervenientes, que dependendo dos casos podem variar. Ana Varela dá um exemplo: «Se o utente tem problemas de fala, pode ser um terapeuta da fala, o próprio professor de educação especial ou o terapeuta ocupacional. Na área da saúde e da reabilitação existe uma série de profissões que podem participar». Há ainda a equitação adaptada, que tem objetivos «desportivos, de competição ou lazer» e onde já são desenvolvidas «competências equestres».

Mas porquê o cavalo?

O cavalo a «passo produz cerca de 60 a 75 movimentos tridimensionais por minuto que são equivalentes aos da marcha humana normal», explicou Ana Varela. A fisionomia do dorso do cavalo «proporciona um correto posicionamento sentado» que por sua vez «altera a resposta do sistema nervoso central» criando no utente «padrões de postura e de movimento» que são a norma. Ou seja, para os utentes, por exemplo, que ainda não conseguem ter uma marcha normal e adequada ao seu desenvolvimento, andar a passo no cavalo pode ser preponderante para criar «esses estímulos sensoriais».

Esta dimensão tridimensional requer três eixos de movimento principais e que nós tivemos oportunidade de experimentar: «Quando estamos sentados no dorso do cavalo a passo, sentimos na zona da bacia um movimento de trás para a frente, depois da esquerda para a direita e de cima para baixo», especifica a responsável pelo centro. Todos estes movimentos são sentidos em simultâneo. Estes movimentos têm vários benefícios, entre os quais: «Melhoria na mobilidade articular, no equilíbrio e na coordenação, normalização do tónus muscular, aumento da tonificação muscular e melhorias na aprendizagem, concentração e orientação espacial». A técnica lembra ainda que no caso das crianças esta terapêutica pode ser vista também «como brincadeira», até pela forma como são conduzidos os tratamentos. «São colocados objetivos com o cavalo, o que acaba por dar motivação aos utentes e aumentar-lhes a auto-estima».

Há ainda outra questão fundamental: o treino dos cavalos. Estes são cavalos «altamente treinados e habituados» a presenciar todo o tipo de comportamentos sem poderem reagir. Ana Varela frisa que há um certo tipo de utentes com patologias que levam a que tenham «movimentos involuntários» ou «reações inesperadas» e que o cavalo tem de estar preparado. Este treino «é constante e demora muitos anos». Também a «qualidade do passo» é «essencial» para a efetividade da terapia.

O Centro Hípico de Alcaria é o único do país que forma técnicos de equitação para fins terapêuticos e é Ana Varela que ministra esta formação. Os resultados da terapia «têm sido muito positivos». O centro chegou a ter um protocolo com o Agrupamento de Escolas de Porto de Mós e os «professores de educação especial deram sempre um feedback muito positivo». Numa só sessão, em tempo reduzido, nós conseguimos comprovar os benefícios mentais que esta terapia pode ter, com uma nota positiva para envolvência do Parque Natural das Serras de Aire e Candeeiros, que é uma mais-valia que faz toda a diferença, refere.

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