Campeão nacional de cross country infantis, campeão nacional downhill em cadetes, juniores e elites, três vezes campeão nacional de enduro master 30 e campeão europeu downhill master 35 são alguns dos títulos que figuram no currículo de Márcio Ferreira. Natural de Alvados, mas a residir em Porto de Mós, o piloto, de 37 anos, compete hoje pela equipa Xdream Blasius/São Brás de Alportel e, em conversa com O Portomosense, traçou um retrato de todo o seu percurso.
A paixão pelas bicicletas começou em 1994, com 11 anos, quando, desafiado pelos dois irmãos mais velhos, decidiu participar numa prova de BTT que se realizou no concelho. «Nessa prova ganhei e os meus irmãos começaram a incentivar-me a ir às provas seguintes», lembra. Logo nesse ano, Márcio Ferreira sagrou-se campeão nacional de cross country – modalidade que hoje se designa por XC. Era o ponto de partida para uma carreira recheada de vitórias.
Com 14 anos, Márcio Ferreira começou a dedicar-se ao downhill, modalidade de que já gostava, mas na qual só era permitido participar oficialmente a partir dos 14 anos. Nessa fase, «não tinha bicicleta» e foi junto de outra equipa do concelho, no caso do Chão Pardo, que conseguiu esse apoio: «São três irmãos, o Edmundo, o Dinis e o Marco Fidalgo, corria com eles, emprestavam-me a bicicleta e consegui [dessa forma] ganhar o primeiro título no downhill», o de campeão nacional de cadetes, em 1998.
Manteve-se no downhill durante vários anos, até que, em 2018, se sagrou campeão europeu master 35, fazendo capa d’O Portomosense nessa altura. Depois disso, Márcio Ferreira, o Golias, como é conhecido no mundo das bicicletas, decidiu dedicar-se ao enduro, uma modalidade que se caracteriza pela sua realização em pistas todo-o-terreno e que Márcio Ferreira já praticava em simultâneo com o downhill. «Tenho cinco a seis provas por ano e, por isso, decidi fazer apenas uma modalidade para não estar tão ocupado a nível de fins de semana. Ao longo destes anos têm sido fins de semana atrás de fins de semana, viagens, malotes… Chega a uma altura em que temos que ponderar e parar um bocadinho», afirma o piloto, acrescentando que «mais vale» dedicar-se apenas a uma das modalidades e divertir-se do que fazer várias sem se divertir «porque começava a sentir frustração por não ter tempo para fazer outras coisas».
O ritmo abranda
Márcio Ferreira treina entre uma hora e meia a duas horas por dia, seis dias por semana, «com todo o tipo de treinos». No entanto, confessa que em «80% do tempo» está «a pensar nas bicicletas».
Na fase da vida em que se encontra, opta por não «estabelecer objetivos a longo prazo», mas não deixa de definir metas que quer atingir: «Este ano, a minha ideia era conseguir revalidar o título de campeão nacional master 30. Vai ser difícil porque vou fazer 38 anos e estou a lutar com rapazes de 30, são oito anos de diferença e eles vêm com o ritmo da elite», revela. A par disso, gostava de, após os 40 anos, «ir às provas do campeonato do mundo de enduro».
Não sabe até quando vai durar a sua carreira e adianta que «a nível físico» se sente «cada vez mais cansado». Golias revela mesmo que, no ano antes de ser campeão europeu, disse «que ia deixar de competir, porque estava desmotivado, tinha lesões atrás de lesões, dores quando acordava…», mas depois voltou a correr e sagrou-se campeão europeu. «Agora tenho olhado para isto de outra forma, que é divertir-me», afirma. «Para me manter ao nível em que estou na competição, não sei se aguento muito mais anos. A nível desportivo, para continuar a fazer atividade física, hei-de continuar até aos 90 anos, nem que seja a fazer caminhadas», brinca.
Profissionalmente, e fora as bicicletas, Márcio Ferreira está neste momento parado para terminar a sua licenciatura em Desporto e Bem-Estar pelo Instituto Politécnico de Leiria. Golias está já na fase final do curso, estando em falta apenas um estágio que ia começar entretanto, mas que foi suspenso devido à pandemia de COVID-19.
A influência da serra
Acha que ter nascido em Alvados, em plena Serra de Aire, pode ter contribuído para aquilo que foi a escolha da sua vida. «É claro que a natureza em si e todos os locais que sejam propícios à prática da atividade desportiva, influenciam as nossas opções», afirma e dá um exemplo: «Se repararmos, a maioria dos surfistas tem a sua origem encostada ao mar, da serra quase ninguém é surfista», explica. «Neste caso, eu tinha aqui os trilhos e a natureza, que me levavam a praticar a modalidade e a gostar dela», conclui Márcio Ferreira.
O piloto considera que «os nossos terrenos são muito mais duros a nível técnico e físico» do que muitos outros que se encontram noutras zonas do país. «Não temos montanhas muito elevadas, mas são bastante íngremes, o que as torna bastante técnicas e duras. Os trilhos, devido à pedra são dos que apresentam maior dificuldade técnica», esclarece. Por ter sempre treinado nestas circunstâncias, Márcio Ferreira diz sentir-se «muito à vontade nos circuitos com pedra» e que, por isso, sempre teve «um pouco de vantagem quando eram circuitos técnicos». «Havia outros circuitos que não eram tanto ao meu jeito e eles [os adversários] tinham vantagem perante mim. É por isso que existem várias provas, em vários locais diferentes», sublinha.