Mendi-J: Um jornal da juventude para a comunidade

27 Abril 2023

Bruno Fidalgo Sousa

O que têm em comum um designer, uma médica veterinária, uma contabilista e um geógrafo? À primeira vista, nada. Se conhecermos a história do Mendi-J, um jornal criado em 1993 para dinamizar a comunidade da Mendiga, esta parceria invulgar começa a fazer sentido. É que o jornal nasceu pela mão de um grupo de cerca de 10 jovens mendiguenses, entre os 13 e os 15 anos de idade. Quando encerrou atividade, dois anos depois, face aos «diferentes percursos profissionais» tomados pelos membros do coletivo, estes eram apenas quatro: o designer Norberto Afonso, a médica Teresa Durão, a contabilista Máxima Silva e o geógrafo Nélio Matos. Rumos de vida que os levaram para longe da juventude, para longe do jornalismo e para longe da Mendiga. Em 2023, celebram-se 30 anos sobre o nascimento do Mendi-J. O Portomosense quis juntar os quatro elementos, mas somente Norberto Afonso se encontra “pela terra” e nele os restantes membros delegaram a responsabilidade de falar connosco.

«Os jornais [à venda na Mendiga] eram muito escassos, havia pouco acesso à informação», relata-nos o designer. Essa necessidade de comunicar com e para a população incentivou os jovens, alunos da Escola Secundária de Porto de Mós, a avançar: «Como adolescentes queríamos também o fascínio da investigação, do descobrir, da divulgação, do pôr a nossa terra mais visível, e também sendo um espaço em que seria importante nós darmos as nossas opiniões, era o nosso canal de comunicação», explica Norberto Afonso. O Mendi-J publicou mensalmente, de forma ininterrupta, 26 edições. Mas não foi fácil.

“Não tínhamos medo, o mundo era o limite”

Chegaram a entrevistar uma campeã olímpica e um presidente da República – Rosa Mota e Mário Soares –, memórias que Norberto Afonso guarda com orgulho, e a cobrir as eleições autárquicas de 1993. Por um lado, «o espírito amador e o espírito do início de um projeto» permitiam outra liberdade: «[O jornal] não tinha qualquer filtro, não tínhamos medo, o mundo era o limite», diz. Das várias rubricas, destaca a Buzina, «que era uma espécie de crítica social e não só, dos problemas das pessoas», mas também «a rubrica dos aniversários» e a rubrica sobre atletismo, onde os repórteres publicavam sobre as competições onde inclusive participavam. Por outro lado, as condições não eram as melhores: a sede original era uma casa devoluta, os exemplares eram impressos na antiga Delegação Escolar de Porto de Mós e a venda era feita porta-a-porta. Isto depois de terem adquirido uma máquina de escrever com as receitas do evento de lançamento, através de um sorteio de rifas. Mais tarde, a sede original, sem eletricidade, foi substituída por uma sala na Junta de Freguesia da Mendiga, entidade que chegou a suportar parte do jornal com um subsídio. Além da máquina de escrever, era necessária uma máquina de fotografar, e condições para revelar os rolos. A venda porta a porta manteve-se, contudo, e era inclusive uma mais-valia: «No meu caso, como era residente da parte de cima da Mendiga, eu ficava com todos os residentes da parte de cima, depois aproveitava, no ato da venda as pessoas iam ter connosco e já nos diziam o que queriam que nós falássemos», explica Norberto Afonso.

A comunidade da Mendiga desde sempre apoiou a ideia. Nem podia ser de outra forma, dado o “estatuto editorial” do periódico: «O espírito era comunidade, era pôr as informações locais no jornal, e era um dos meios de comunicação da altura, sem internet».

A última das edições do Mendi-J foi publicada em junho de 1995. A memória – e a ideia – não morreu. «[O regresso do Mendi-J] já esteve várias vezes em cima da mesa», confessa Norberto Afonso. «Já houve várias gerações [a querer fazê-lo], hoje não sei, se calhar se alguém pegasse nisso…», deixa o desafio.

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