Os municípios de Porto de Mós, Batalha, Leiria, Marinha Grande, Pombal e Ourém, acionistas minoritários da Valorlis – Valorização e Tratamento de Resíduos Sólidos, S.A., a empresa responsável pela valorização e tratamento de resíduos nos seis concelhos, continuam a recorrer à justiça para tentar contrariar deliberações tomadas com o voto favorável dos representantes do sócio maioritário privado, a EGF – Empresa Geral do Fomento.
Depois de num passado recente terem apresentado providências cautelares com o intuito de travar o aumento das tarifas de tratamento de resíduos, desta vez os municípios apontam baterias para a distribuição de dividendos e o resgate da totalidade de suprimentos, ou seja, dos empréstimos feitos pelo acionista à empresa.
De acordo com nota de imprensa da Comunidade Intermunicipal da Região de Leiria (CIMRL), a que pertencem todos os municípios à exceção de Ourém, a ação judicial de nulidade das deliberações tomadas pela Valorlis constitui uma «forma de protesto» contra as medidas que, acreditam, «conduzem à descapitalização da empresa por parte do acionista privado maioritário».
Segundo a mesma nota em assembleia geral de acionistas do passado dia 26 de março, os representantes da EGF, uma das empresas do grupo Mota-Engil, com o voto contra de todos os municípios, decidiram «promover a distribuição de lucros no montante de 400 mil euros, a que acresce o resgate de 1,7 milhões de euros que foram subtraídos da empresa».
A CIMRL afirma, ainda, que «o contrato de concessão realizado pelo Estado Português também não está a ser cumprido, designadamente ao nível da recolha seletiva e cumprimento das metas de valorização ambiental» pelo que os autarcas solicitaram uma reunião urgente à nova ministra do Ambiente e da Energia, a quem pretendem apresentar «um relatório técnico fundamentado com o detalhe dos incumprimentos legais e ambientais por parte da Valorlis».
Entretanto, à boleia de uma moção aprovada (e remetida) pela Assembleia Municipal da Batalha contra a proposta de aumento das tarifas de resíduos urbanos por parte da Valorlis, o assunto chegou também à Assembleia Municipal (AM) de Porto de Mós. Chamado a esclarecer os deputados municipais, o presidente da Câmara, Jorge Vala, não poupou críticas à empresa concessionária.
Depois de nos últimos dois anos ter estado com o seu colega de Leiria, a representar os seis municípios no conselho de administração da Valorlis, Jorge Vala diz que o que assistiu foi «à sistematização de tentativas de aumento de tarifa junto do regulador».
Segundo o responsável autárquico, os municípios estão «encostados à parede com uma tarifa superior a 100 euros por tonelada quando em 2018 a mesma não chegava a 25 euros». No entanto, e apesar deste aumento brutal, «temos o regulador a autorizar [a empresa a aumentar a tarifa] e a não autorizar, e bem, os municípios a aumentar em muito mais do que aquilo que é taxa de inflação mas, por outro lado, também não os autoriza a ter prejuízo», disse.
«Estamos aqui, então, num colete de forças que tem em vista, essencialmente, o lucro de uma empresa privada com apenas seis clientes, que são os municípios, e estes têm de responder a todas estas vontades da administração da empresa», lamentou.
Olhando para a realidade atual, o presidente da Câmara considera que «se há exemplos péssimos e simples daquilo que foi feito de mau, no tempo da Troika em termos de venda de património que era gerador de receita para o Estado, este é um deles».
A título de exemplo, disse que «a Valorlis, por força da necessidade de obtenção de um novo título ambiental único» foi impedida pela CCDR de continuar a partilhar com a Valorsul a sua central de tratamento de resíduos, e com isso deixou de receber daquela empresa cerca de 2,5 milhões de euros. Ora, o que fez de imediato foi «pedir ao regulador um aumento da tarifa para continuar a encaixar os 2,5 milhões».
Perante isto, Jorge Vala lança várias perguntas: «Então, neste negócio não há imponderáveis legais ou de mercado que, eventualmente, o concedente tenha de suportar? Não há risco nenhum no negócio? Por força da necessidade de se cumprir a lei há aqui uma redução de um encaixe de 2,5 milhões de euros e esse encaixe tem de ser pago pelos municípios, não há alternativa? Então, uma empresa que tem um EBITDA [lucro antes dos juros, impostos, depreciação e amortização] superior a 4 milhões de euros não pode disponibilizar do seu rigorosamente nada?».
Pior que isto, diz o autarca, «a empresa aprovou com os votos contra dos municípios a distribuição de dividendos e não é pouco». No seu entender e dos restantes presidentes de Câmara «isto pode configurar uma descapitalização da empresa para continuar a forçar o aumento da tarifa ou o aumento do endividamento (que já é muito significativo)» e daí terem avançado com mais uma ação em tribunal.
“Estas tarifas até metem medo”
Na discussão deste ponto, Luís Almeida (PSD) começou por afirmar que «ler na moção aprovada pela AM da Batalha que a Valorlis pretende fazer um aumento de tarifa na ordem dos 80%, só isso já mete medo». O deputado disse também que «estas empresas são criadas para dar lucro e quando dão prejuízo aumenta-se até deixar de dar e quando dão lucros como os seus sócios têm de ser ressarcidos dos investimentos, há que aumenta o lucro a qualquer preço».
Liliana Pereira (PS), por sua vez, disse que «se estes valores nos assustam, temos de olhar um bocadinho para aquilo que será o nosso futuro, neste caso, a obrigatoriedade, por imposição da União Europeia, de aumentar as taxas de separação de resíduos orgânicos e de resíduos têxteis.
«Se com aquilo que agora temos, os aumentos são na ordem do que aqui foi falado, imagine onde é que isto irá parar quando forem cumpridas estas duas novas obrigatoriedades», frisou.
Foto | Jéssica Silva