
Foto: Isidro Bento
«O Parque Natural das Serras de Aire e Candeeiros (PNSAC) nasceu com muitas críticas da população e com algumas, no pós primeiro momento, dos autarcas por não poderem participar no modelo de gestão. Agora que a lei prevê a co-gestão das áreas protegidas onde vamos ter a possibilidade, a capacidade e o poder técnico para decidir e estarmos em parceria com os técnicos, já não sei bem se aquilo que tanto reclamaram é o que efetivamente querem» afirmou o presidente da Câmara de Porto de Mós, no decorrer da mesa-redonda realizada em Mira de Aire, no encerramento das comemorações dos 40 anos do PNSAC, isto depois de Fernanda Asseiceira, a presidente da Câmara de Alcanena ter lamentado que nem todos os municípios da área do PNSAC estejam disponíveis para abraçar o desafio da co-gestão.
A autarca disse que «o decreto-lei que visa dar a oportunidade aos municípios de participarem na gestão das áreas protegidas, embora tardio é uma boa medida», mas lamentou que os sete municípios ainda não tenham avançado no processo da co-gestão «porque quatro disseram que sim, e três, não». Fernanda Asseiceira confessou mesmo «alguma frustração de entrar e sair como presidente de câmara sem ter tido uma verdadeira oportunidade de participação na gestão desta área protegida».
A vice-presidente da Câmara de Santarém, Inês Barroso, entendeu justificar o porquê de o seu município ser um dos que, para já, não aceita integrar o novo modelo. De acordo com a autarca, «a Câmara de Santarém, que ainda não aceitou a transferência de competências em várias áreas», neste caso em específico defende que «a proximidade às pessoas e aos territórios tem sempre mais-valias para a qualidade de vida» mas antes de aceitar quer «perceber melhor algumas das transferências que possam vir a ser feitas do ponto de vista financeiro ou de outros fundos, sejam eles nacionais ou comunitários, e venham ajudar as autarquias a terem o papel determinante no território que, de facto, querem ter». Assim, o município scalabitano «quer ser parte da solução, não estando contra as coisas mas interessado em trabalhar neste novo paradigma da proteção ambiental», frisou.
“Empresários da pedra preocupam-se com o ambiente”
Jorge Vala disse, a propósito, que «os autarcas não são mais os terroristas do ambiente» mas «pessoas conscientes e que querem defender o território que têm à sua responsabilidade» e que esse é «o propósito adotado pelos sete municípios». «O PNSAC, neste aspeto, não tem muros nem fronteiras: somos todos, contamos todos, aqueles que têm mais área e os que têm menos, e somos todos muito importantes num território que é um autêntico queijo suíço e em que aquilo que um faz de mal vai de certeza afetar o vizinho». Assim, afirmou, «temos de estar todos juntos para o que é bom e naquilo que teremos de fazer relativamente ao que é mau e Porto de Mós está, desde o primeiro momento, num processo de soluções e parcerias e tem as juntas de freguesia consigo». Apesar desta postura comum, Vala reconheceu que «nestes anos todos, o Parque serviu de costas largas para muitos autarcas dizerem que a responsabilidade não era deles, mas do PNSAC».
Maria João Botelho, que dirigiu o PNSAC nos seus primeiros anos, confessou não ter um conhecimento aprofundado da nova legislação mas, na sua ótica, «o modelo de co-gestão vem consagrar, na prática, algo que ao nível do Parque já existe desde a primeira hora, a participação ativa das câmaras e das juntas de freguesia». A antiga responsável destacou o facto da área protegida ter sido «classificada a pedido das câmaras» e de aqui ter sido criada «a primeira associação de desenvolvimento local, a ADSAICA», o que faz com que nalguns aspetos «o PNSAC tenha sido pioneiro» a nível nacional.
A arquiteta defendeu que «as câmaras não podem andar a puxar para um lado e o Parque para outro, tem de haver uma conjugação de esforços e partilha de conhecimentos, e esta relação é vantajosa para ambos». Maria João Botelho considerou, ainda, haver, toda a vantagem em voltar ao modelo em que a direção do Parque está próxima das pessoas e tem um rosto, recuperando-se a figura do diretor.
Sofia Castel-Branco da Silveira, outra antiga responsável do PNSAC, concordou com as vantagens da «gestão de proximidade», considerando que, «por vezes, basta uma conversa cara a cara com os autarcas para que estes percebam a razão de determinado constrangimento ou se encontre a solução para um problema», no entanto, lembrou que já vários modelos de gestão foram testados, apesar de, como lamentou, não ter havido a devida avaliação antes de se passar para o seguinte, e que a tendência tem sido sempre no sentido de redução de recursos humanos e financeiros. A técnica superior acredita que a co-gestão será benéfica mas lança o alerta: «Não podemos esquecer outras áreas da gestão das áreas protegidas, alguém tem de dar a cara por elas. Não podemos “comer a carne e deixar os ossos”, ou seja, protocolar com as entidades externas exclusivamente o que pode ser visto como interessante do ponto de vista turístico, económico e de desenvolvimento e esquecer as regras que têm de existir para a salvaguarda do património».
Fernanda Asseiceira reforçou a ideia de que as áreas protegidas «devem ter direção e estrutura própria, autonomia administrativa e financeira», e que «deve haver uma discriminação positiva» e as populações locais serem de algum modo compensadas por viverem num território sujeito a vários constrangimentos. Já Jorge Vala, destacou o papel dos empresários da pedra pelas preocupações ambientais que têm, «sendo os principais interessados em criar planos que definam as áreas onde se pode explorar». Maria João Botelho corroborou esta afirmação afirmando que por diversas vezes os empresários locais estiveram mais avançados que a própria lei e que «quando surgiram novas regras, algumas já eram uma realidade no PNSAC». O turismo, também com regras, foi visto por todos como uma mais-valia a explorar e, nesse âmbito, foi defendido o trabalho em parceria em projetos intermunicipais como o da Rota do Carso.