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O presente e o depois da COVID-19

17 Abril 2020
Jéssica Moás de Sá

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Jéssica Moás de Sá

17 Abr, 2020

Sónia Leirião é psicóloga no Hospital de Santo André, em Leiria e tem acompanhado de perto as diferentes dinâmicas que a pandemia de COVID-19 tem provocado. Se na saúde tem trazido muitas adaptações, nas famílias também. Portugal teve «todo que se ajustar » e nas dinâmicas familiares isso não é exceção. Os pais que não podem ficar com os filhos, tiveram de encontrar mecanismos e em alguns casos vão manter-se afastados das famílias devido ao risco de contaminação e para os pais que podem ficar em casa com os filhos houve também uma adaptação. As rotinas foram alteradas e agora, algumas famílias estão juntas «24 sobre 24 horas» e sempre que se sai da rotina «existem constrangimentos», frisa. «É claro que vai haver mais stress, mais situações de conflito, porque as pessoas estão mais tempo juntas, a probabilidade de se chatearem aumenta. Tem que haver uma reaprendizagem em estar em família», explica a psicóloga. A juntar a toda esta nova dinâmica está «o medo e a ansiedade»: «O medo e a ansiedade combatem-se falando sobre as coisas, recorrendo a fontes fidedignas de informação e percebendo que isto é uma fase».

Para a profissional, é essencial, para quem tem filhos, falar sobre o assunto, até porque ao falar com as crianças, os adultos estão também eles «a gerir emoções». Sónia Leirião alertou para a possível «hipervalorização de todas as sensações corporais» porque as pessoas sabem que agora não poderão ir ao hospital com tanta facilidade. Essa «corrente de pensamentos» só pode ser desvalorizada «fazendo coisas, estabelecendo horários mesmo dentro de casa, existindo hora para comer, dormir e fazer tarefas de casa». Aproveitar também para «ensinar outras coisas» às crianças e brincar com elas, uma vez que «não estão habituados a ter o pai e a mãe tanto tempo nos mesmos espaços». Sejam adultos ou crianças, a psicóloga acredita que é importante, primeiro que tudo, entender que é normal que se sintam «aborrecidos, tristes, que sintam saudades» mas que percebam que este pode ser um tempo para aproveitar a família.

A profissional lembra ainda que é muito importante que se mantenham «as rotinas, porque as rotinas são muito organizadoras. Parece que fazemos muitas coisas, levantamo-nos, comemos, estudamos, dormimos». É importante que se faça uma «lista com horários», por exemplo, no caso dos adultos, podem decidir «limpar uma divisão da casa», mas não devem ficar o dia todo «a fazer a mesma coisa, podem ver um filme ou série, contar uma história à criança, ler um bocadinho, ouvir música, meditar», atividades que os «façam sentir bem».

O luto solitário

Uma das diretrizes da DGS é que os funerais tenham o menor número possível de pessoas, sem velório e missa e o caixão não pode ser aberto. Esta forma diferente de viver o luto pode trazer alguma mágoa, no entanto, frisa Sónia Leirião, isso dependerá da forma como o encararmos. «O funeral é um ritual para quem é católico e como ritual que é, nós temos que criar outros rituais para trabalharmos esse mesmo luto», explica. A psicóloga lembra que «não é o facto de não irmos à casa mortuária fazer a despedida, que não nos vamos despedir, porque o podemos fazer onde quer que estejamos».

A despedida pode ser feita de diversas formas: «Através de uma carta, gravando um áudio com aquilo que gostávamos de ter dito e não dissemos, a falar, porque quando falamos para nós próprios estamos a falar para todas as nossas células, estamos todos na mesma dimensão e eu acredito que quem parte também está aqui connosco», frisa. Sónia Leirião lembra que tem que existir um reajuste de muitas coisas e os «sentimentos e emoções» é um dos maiores reajustes: «Estamos todos a fazer coisas que não estamos habituados a fazer, a gerir coisas que não estamos habituados a gerir, e a morte é mais uma circunstância que nós não estamos a contar, no meio de tanta coisa. O foco deve ser sempre dirigido para o nosso bem estar, saber como é que eu vou lidar com isto, da melhor forma, para me sentir bem».

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