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Parar de fumar ou fumar até parar: Uma decisão para a vida ou para a morte

14 Setembro 2023
Bruno Fidalgo Sousa

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Bruno Fidalgo Sousa

14 Set, 2023

Aos 12 anos, Pedro Costa, de Porto de Mós, começou a fumar. «Coisas de miúdos». Aos 27, abandonou o tabaco. Foram 13 anos que deixam marcas para a vida, incluindo duas aventuras hospitalares. Sofreu de um primeiro pneumotórax e retornou ao vício durante oito meses, mas um segundo fê-lo efetivamente repensar as suas decisões. Afinal, «ninguém começa deliberadamente a fumar porque gosta». Mas todos param de fumar porque deixam de gostar, ou porque nunca gostaram efetivamente do ato de travar o cigarro. Se a primeira frase é de Pedro Costa, um dos ex-fumadores com quem O Portomosense esteve esta edição à conversa, a segunda é a opinião generalizada dos três entrevistados.

Num mundo onde impera a guerra, o conflito social e a dualidade moral, há uma luta que só pode ser travada internamente: o largar de um vício. Que é, no fundo, «um prazer fictício: uma pessoa só se sente bem porque repôs o nível de nicotina, quem nunca fumou e não tem esse tipo de dependência acaba por não precisar», acredita o jovem portomosense, que está há um ano e dois meses sem fumar. O truque é simples, como explica: «Isto é como tudo na vida. Existem duas coisas que vamos sempre atrás na vida, dor e prazer, e quando nós temos mais prazer do que dor a fazer alguma coisa nós vamos fazer essa coisa repetidamente».

Pedro Costa foi mais forte – depois de perceber que tratamentos de choque ou comprimidos de nicotina não resultaram, associou o ato de fumar ao ato de dor e hoje é um homem diferente. Mas nunca foi fácil, antes pelo contrário: «Deixar de fumar é uma situação muito difícil, tem de haver muita força de vontade e controlo».

Tal como ele, também Tiago Pinto, de São Jorge, e Francisco Carreira, do Juncal, confessam que é difícil e que depende de muito “querer”. Três gerações diferentes, os três com o mesmo vício, que não vê idades, raças, credos, moradas, géneros. A vontade de voltar a fumar pode durar anos, claro – talvez os mesmos anos de vida que todos os cigarros já fumados tiraram –, mas as benesses são uma força maior na decisão tomada pelos três portomosenses.

Para Pedro Costa, por exemplo, «em termos de tosse e [de ter] aquele catarro pesado depois de uma noite a fumar muito, isso nunca mais aconteceu. Resistência melhora, o cheiro melhora, o apetite melhora, há uma que é muito importante, a carteira, nota-se muito a diferença, eu se calhar gastava 200 euros por mês em tabaco». Já Francisco Carreira não faz «essas contas, mas o dinheiro há-de aparecer em algum lado».

“Não tem jeito nenhum, é meter fumo para dentro e deitar para fora”

A completar seis décadas de vida, o juncalense ainda guarda em casa o último maço de tabaco que comprou, 27 anos antes. «Para eu ter a certeza que ele estava ali e que não lhe tocava», explica. Já começou a fumar tarde, por volta dos 20 anos, mas chegou aos dois maços diários. 40 cigarros que justifica com a rotina de sol a sol («Eu saía muito cedo de casa, saía às 6 horas da manhã e acendia logo um cigarro, às vezes chegava à meia-noite, era muita hora fora de casa e as mãos tinham de estar a fazer alguma coisa»).

Abandonou definitivamente o tabagismo quando a esposa estava grávida do primeiro filho e novamente com a rotina em causa: «À noite, em casa, tinha de vir sempre à rua fumar e eu pensei: “Então isto não tem jeito nenhum, por causa do tabaco, vir para a rua, tenho que alterar o meu funcionamento por causa do tabaco, não, eu não estou para ser dependente disso”». De repente já não fumava e por consequência já não tossia de madrugada, embora ainda levasse a mão ao bolso quando a necessidade apertava.

Como diz, «a gente está ali anos e anos sempre prontos para fumar». Mas «agora não», até acha «estranho como é que as pessoas fumam, aquilo não tem jeito nenhum, é meter fumo para dentro e deitar para fora».

Dos 40 cigarros aos 40 quilómetros

Tiago Pinto, de 44 anos, começou aos 16 e largou o vício vinte anos depois, depois de algumas tentativas. A O Portomosense, justificação a decisão com as «alturas em que um gajo sentia-se mal, depois estava sempre a fumar, depois era o mau cheiro, depois a mulher queixava-se que cheirava muito a tabaco, os garotos começaram a queixar-se também » e Tiago Pinto «não queria fumar por fumar».

Quando iniciou um tratamento específico para largar o tabaco, já depois de tentar com adesivos de nicotina, foi de vez: «Aquilo foi uns choques elétricos nas orelhas e no nariz, uns comprimidos por causa da ansiedade». Era suposto tomá-los durante oito dias, mas só os usou durante dois, três dias, antes de finalmente largar. Sem voltar atrás: «Ainda experimentei passado uns 15 dias ou três semanas, disse “Olha, deixa-me experimentar para ver o que é que faz”. Experimentei, nem fui eu que comprei, deram-me o cigarro, mas nem fumei, disse “Epa, não, vão vale a pena”».

Dos três, é o que relata ter tido um processo mais fácil, motivado por um hobby que ainda hoje o acompanha: a corrida e o trail. E se «dantes fazia 100 metros e já não fazia mais nada», hoje faz «40, 100 quilómetros», um dos vários benefícios que relata ter tido ao abandonar o tabagismo.

O primeiro fator positivo que notou foi «na carteira», mas também «na saúde, respirar melhor, o cheiro da comida, o sabor da comida». Aliás, algum tempo depois de deixar de fumar, pediu «à esposa para lavar a roupa porque a roupa cheirava mal, cheirava a tabaco e na altura não notava nada disso». Um odor que também Pedro Costa e Francisco Carreira relatam como enjoativo aos dias de hoje, e que nenhum guarda com carinho.

“Ou fumava ou não fumava”

Francisco Carreira não teve qualquer estratégia – «ou fumava ou não fumava». Já Pedro Costa começa na carteira, aconselhando a quem quer deixar a fazer «um pacto consigo mesmo de meter todo o dinheiro numa conta poupança», e termina nas pequenas estratégias do dia-a-dia, de brincar «com canetas, palitos, a colher do café», como o próprio fez. E Tiago Pinto corrobora: «Às vezes nem era a vontade, às vezes é o vício de estar com o cigarro na mão». Mas a derradeira estratégia parte sempre da vontade humana. «O único conselho que eu dou é que a pessoa tem de querer», acredita, reforçando que «aquilo só é difícil se a gente não tiver vontade. Se tu tiveres vontade, é mais fácil», diz. Por outro lado, Pedro Costa «também era uma daquelas pessoas que tentou tudo e dizia que não era capaz», mas depois tomou uma decisão firme, e é essa decisão que considera «a parte mais importante». «Depois é não desistir e não se julgar, se a pessoa falhar, fuma uma vez, [mas] tem de continuar a caminhada».

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