“O luto de uma vida não cabe em 5 dias” é esta a convicção da Acreditar – Associação de Pais e Amigos das Crianças com Cancro que serviu de mote para lançar, no passado dia 1 de setembro, uma petição para o alargamento do período de luto parental, de cinco para 20 dias. A associação considera que os atuais cinco dias previstos na legislação são «manifestamente insuficientes» para os pais que perdem um filho, naquele que é um «processo intenso, complexo e que pode durar uma vida». «Não é em cinco dias que se conseguem até resolver as questões mais burocráticas. Os pais têm que voltar a uma vida normal e têm que tentar reorganizar toda a sua estrutura familiar», justifica Telma Sousa, que faz parte da Acreditar há mais de 20 anos.
Embora tenha sido a associação a avançar com a petição, Telma Sousa esclarece que esta surgiu através de pais que perderam filhos, os «verdadeiros motores» desta causa, e que sempre viram esta lacuna na legislação. «Estes pais deram a sua voz, a Acreditar ouviu e resolveu pedir à sociedade civil que se juntasse para que conseguíssemos fazer chegar o barco a bom porto», explica. E o barco chegou mesmo. Em poucos dias, mais de 83 mil pessoas assinaram a petição e foram vários os partidos que se juntaram a esta causa: PS, BE, PCP, PAN e o PEV, alguns dos quais, já apresentaram projetos de lei. «Foi uma alegre surpresa. Não tínhamos dúvidas que íamos ter uma adesão bastante grande mas nunca pensámos que fosse tão rapidamente. A capacidade não foi nossa, nós apenas colocamos a petição a andar, a sociedade civil é que se mobilizou e fez com que tudo fosse possível», sublinha.
O objetivo inicial era reunir 100 mil assinaturas, no entanto, dada a «necessidade gritante» de alterar a legislação, a associação não quis esperar mais e no passado dia 12 de outubro entregou a petição no Parlamento. Agora é esperar que haja a discussão na Assembleia da República e que a consagração do alargamento do luto parental se concretize. Acredita que irão conseguir esse objetivo? «Sim, acreditamos. É por isso que lhe chamamos Acreditar, essa é a nossa palavra de ordem. É mais do que justo que assim seja porque esta situação já se arrastou durante muitos anos», responde Telma Sousa.
A associação Acreditar, que há mais de 27 anos acompanha famílias de crianças com cancro, não se limitou apenas a trazer para a luz do dia um assunto que, defende, estava «na gaveta» como também estudou a legislação existente na União Europeia. Nessa pesquisa pôde constatar que há uma «disparidade muito grande» nos diferentes regimes jurídicos que vão desde as 26 semanas, na Dinamarca, a apenas um dia, em Malta. Na tentativa de «equilibrar a balança» entre a estrutura macroeconómica do país e as necessidades dos pais, a Acreditar acabou por concluir que a legislação praticada na Irlanda – cujo o luto parental são 20 dias – era a que mais se adequava. «Sabemos que 20 dias não são suficientes para dar apoio a estes pais mas, pelo menos, já faz alguma diferença para que estes se reergam», reconhece.
(Este artigo faz parte do Suplemento Requiem da edição 956 d’O Portomosense)