Na hora de pagar a prestação da casa, a fatura da água ou os almoços dos filhos, qual escolher?…
Começo este editorial por aquilo que podíamos chamar, talvez sem grande exagero, os novos pobres. Numa das peças desta edição, lemos que as famílias portomosenses devem à Câmara quase 300 mil euros. Claro que não são todas, é um número ínfimo delas. Já não tão ínfimo quanto isso é o valor e foi esse que começou por despertar a atenção mas, ouvidas as explicações do presidente da Câmara, a quantia acaba por passar para segundo plano.
Mais importante que o valor da dívida, é saber que assenta, e muito, na falta de pagamento das faturas da água e, pasme-se, das refeições escolares. E, pasme-se de novo… boa parte de quem deve pertence à “classe média”. Ou seja, são pessoas que noutros tempos teriam uma vida mais ou menos estável. Não eram ricos, nem pobres, mas não tinham que se defrontar com um dilema presente na vida de muitos, hoje: na hora de pagar a prestação da casa, a fatura da água ou os almoços dos filhos na escola, qual ou quais destes sacrificar para que, pelo menos, algum seja pago? É este o drama!
Neste momento, temos pessoas com uma vida perfeitamente “normal” à luz da sociedade, ou seja, com casa, carro e emprego estável, mas a viver, quase sempre, em silêncio e o mais escondidas possível, situações que até agora só reconhecíamos nas famílias assumida e comprovadamente pobres. Isto levanta novos desafios a todos os nós ou, pelo menos, àqueles a quem as dificuldades alheias não são indiferentes.
Claro que o trabalho principal está nas mãos da Câmara e das entidades sócio-caritativas, de quem se espera atenção, sensibilidade, discrição e ações concretas. No entanto, somos todos desafiados a estar atentos a quem está à nossa volta e tentar ajudar quem possa estar a precisar de ajuda. A questão é de elevado melindre porque a situação é vivida em famílias que, à partida, se pensaria que estivessem algo salvaguardadas desse drama e, claro, serão poucas as que não terão dificuldade em assumir o momento menos bom que atravessam.
Da área social passo para a cultura. Num grupo de amigos (todos eles com maior conhecimento que eu da realidade regional em termos culturais) discutia-se a política e a prática cultural dos municípios da região e a dada altura gerou-se um invulgar consenso: «Porto de Mós faz um bom e meritório trabalho em termos do apoio à produção cultural local mas continua a olhar muito para o seu umbigo e a esquecer o país e o mundo à sua volta, faltam espetáculos, exposições e outro tipo de dinâmicas envolvendo artistas ou grupos de dimensão nacional». Nesse campo «está a ficar um pouco para trás», dizia alguém, frequentador regular das salas de Leiria, Ourém e Alcobaça. «O apoio à associação Ala D´Artistas, que tem surpreendido com uma oferta cultural que raramente chega a Porto de Mós (quanto mais ter produção local), é um excelente passo mas faltam outros», reforçava alguém do outro lado da mesa, reconhecendo, contudo, estar a comparar a oferta cultural de cidades com a de vilas.
A “dois dias” de inaugurarmos um novo espaço cultural, penso que será, também, importante que poder e oposição, bem como a comunidade em geral, reflitam sobre o que fazer para que os equipamentos culturais municipais possam ter taxas de utilização, tanto por parte dos agentes culturais, como do público, condizentes ou, mais de acordo, com o elevado investimento que representaram para os cofres do Município.