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Quando o jornal vira coleção

10 Janeiro 2023
Jéssica Silva

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Jéssica Silva

10 Jan, 2023

São 40 anos que se materializam em 987 edições d’O Portomosense. Parece muito? Pois então provavelmente ficará admirado se lhe disser que há quem as tenha todas guardadas. É o caso de Armindo Vieira, João Neto e José Alberto Machado que ao longo dos anos foram colecionando, cuidadosamente, cada uma das edições do jornal. Estes são apenas três exemplos – provavelmente haverá mais – de quem tem desde o número um até ao 987. Desde 1983 até esta primeira edição de 2023. São milhares e milhares de páginas em papel, algumas cuja tonalidade amarelada vai já acusando a passagem do tempo mas que, ainda assim, permanecem conservadas.

“O Portomosense esteve sempre em primeiro lugar”

Depois de alguns projetos fracassados que despontaram no concelho ao longo do tempo, foi com grande contentamento que Armindo Vieira soube que ia nascer um jornal em Porto de Mós. «Vi um anúncio sobre isso e como portomosense fiquei muito satisfeito», conta. No dia 6 de janeiro de 1983 era, então, publicado o primeiro número d’O Portomosense. Doze páginas a preto e branco e praticamente sem fotografias. Desde esse momento, Armindo Vieira passou a conservar religiosamente todas as edições que ia comprando, sem nunca se tornar assinante. «Comecei a guardar por interesse, até porque quando as coisas começam nunca sabemos se continuam por muito ou pouco tempo», justifica. Nessa altura estava ainda muito longe de imaginar que um dia também ele iria fazer parte das páginas desse quinzenário.

«A vida dá voltas e deu uma volta de eu começar a trabalhar no jornal», recorda. Já colaborava com a Rádio Pedreiras – hoje Rádio Dom Fuas –, quando, após a fusão do jornal e da rádio, lhe foi feito o convite de trabalhar a tempo inteiro n’O Portomosense, como redator principal. A partir daí deixou de comprar o jornal e passou a recebê-lo enquanto colaborador. Anos mais tarde, uma nova volta da vida. Deixou de colaborar com o jornal e com a rádio mas nem por isso o interesse pel’O Portomosense se desmoronou. «Nunca deixei de ter o jornal, de me interessar e de manter o colecionamento. O Portomosense para mim esteve sempre em primeiro lugar, no caso de arquivamento e de notícias locais. Essa ligação nunca se perdeu», assegura.

Ao princípio, Armindo Vieira começou por manter os jornais em caixas mas depois de já ter dezenas reunidas percebeu que, se não fizesse nada, estes poderiam estar na iminência de se danificarem. «Decidi que a cada 100 [edições] ia fazer um embrulho, com os jornais espalmados», explica. «Os mais antigos já estão guardados há quase 40 anos mas nem por isso estão a dar sinais de que estão a degradar-se», garante, reconhecendo que o seu estado de conservação também se deve ao cuidado que tem com eles. «Estão bons. Ainda aqui há tempos precisei de reunir umas informações e fui vê-los todos», sublinha. Por fora de cada molho está a indicação do intervalo de datas e o respetivo número de edições para «ser mais fácil» de procurar, se for caso disso, o que admite ser «muito raro». E a explicação para isso é muito simples: a facilidade e a rapidez que encontra na página online do Arquivo Municipal, onde pode consultar a maior parte das edições d’O Portomosense e ter acesso à informação que neles consta, leva a que não sinta necessidade de recorrer aos jornais impressos.

“Tinha uma ligação profunda ao jornal”

Também com uma forte ligação ao jornal, de que foi diretor, e à CINCUP, cooperativa que ajudou a fundar, João Neto, é outras das pessoas que coleciona O Portomosense praticamente desde o seu começo. «Cerca de dois anos depois de o jornal ser fundado, o João Matias decidiu encadernar as edições do jornal e eu entrei nesse “pacote”. A partir daí guardei todas as edições», conta. Já lá vão 40 anos. «Decidi guardar o jornal estes anos todos por ter um pouco a ver com ele e ter muita proximidade. Eu tinha uma ligação muito profunda ao jornal e à rádio. Escrevo no jornal desde o princípio», afirma o autor da crónica Histórias da Minha Burra.

Hoje em dia, João Neto admite que não tem todos os jornais encadernados mas nem por isso estão desprezados ou ao abandono. Antes pelo contrário. Permanecem arrecadados naquela que é, nas suas palavras, a «melhor e mais bonita» divisão da casa, «a Cave dos Encantos», onde guarda as coisas de que mais gosta, como vinho, livros e quadros. «Os jornais estão mais ou menos climatizados, mais ou menos arrumados, e estão por ordem», descreve.

João Neto conta que é raro consultar esses jornais, apenas o faz em situações muito específicas, como quando precisa de procurar informação para sustentar algumas das críticas que dirige, sobretudo ao poder político. «Como escrevo e me preocupo muitas vezes com a política de Porto de Mós, muitas vezes vou lá buscar memórias. Não tem só a ver com a escrita da Burra mas com o “pica-miolos” que faço às entidades que andam por aí», explica.

“É um privilégio” ter os jornais guardados

Todas as quinzenas, o ritual repete-se na casa de José Alberto Machado: «O jornal chega e a minha mulher diz-me: “Olha, chegou O Portomosense!”. Dá-se uma passagem de olhos por cima e guarda-se na caixa». Despertado pela atenção do surgimento de um novo jornal no concelho, José Alberto Machado é assinante «desde que o jornal apareceu», situação que ainda hoje se mantém. O tempo foi passando e, um dia, quando já tinha uma quantidade significativa de jornais acumulados, José Alberto Machado decidiu que não se queria desfazer deles. «Pensei em pô-los todos num montinho e fui guardando para recordação», refere. Hoje orgulha-se da coleção que tem mas nem por isso da forma como a tem preservada. «Tenho pena que não estejam muito cuidados. Tenho-os dentro de uma caixa, quase por ordem. A maior parte está esticada mas os últimos estão dobrados», descreve. José Alberto Machado confessa a vontade de ter todas as edições d’O Portomosense encadernadas mas lamenta o facto de não poder ter essa possibilidade: «A minha reforma é pequenina, são 350 euros, por isso não me posso esticar muito. Se houvesse alguém que me desse uma ajudinha, talvez até pensasse nisso», desabafa.

Com uma vida «felizmente bastante ocupada» que não lhe permite ter tempo livre para pesquisar números antigos, José Alberto Machado afirma que quase nunca os consulta. Embora admita que já teve essa «tentação», reconhece que o facto de os jornais não estarem encadernados e de essa procura se equiparar quase a “procurar uma agulha num palheiro”, leva a que tenha ainda menos vontade. Ainda assim, diz ser «um privilégio» poder ter todas as edições guardadas e intactas d’O Portomosense.

Foto | Jéssica Silva

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