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Reformas antecipadas dos trabalhadores das pedreiras: Problema ou oportunidade?

12 Novembro 2021
Isidro Bento

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Isidro Bento

12 Nov, 2021

Nos últimos anos os trabalhadores das pedreiras conseguiram importantes vitórias em termos de regalias sociais. Assim, em 25 de março de 2019, menos de 15 dias após cerca de 70 trabalhadores das pedreiras terem feito uma marcha de protesto em Lisboa, foi publicada em Diário da República a portaria que alarga aos trabalhadores da indústria da pedra que trabalhem diretamente na extração ou na transformação primária da pedra, incluindo a serragem e corte de pedra em bruto, o regime especial de acesso às pensões de invalidez e de velhice dos trabalhadores das minas. Com a extensão aos trabalhadores das pedreiras deste regime jurídico puderam passar a aceder à reforma de velhice mais cedo que o comum dos trabalhadores do regime geral já que por cada dois anos de serviço efetivo reduzem um ano na idade da reforma, até ao limite dos 50 anos.

Depois de terem visto a sua profissão ser considerada de desgaste rápido, os trabalhadores das pedreiras conseguiram outra vitória com a publicação em 16 de setembro de 2020, do Decreto-Lei n.º 70/2020 que veio atualizar a idade de acesso às pensões e eliminar o fator de sustentabilidade nos regimes de antecipação da idade de pensão de velhice do regime geral de segurança social.

E, afinal, o que é esse fator de sustentabilidade? De uma forma simples podemos dizer que é um corte na pensão que penaliza as reformas antecipadas de e que em 2020 estava fixado nos 15,20%. Na altura em que este diploma foi aprovado já não era aplicado o corte nas pensões de 0,5% por cada mês de diferença face à idade de acesso à reforma (66 anos e cinco meses).

Agora com mais esta “benesse” com a extinção do fator de sustentabilidade, optar pela reforma antecipada passou a ser ainda mais apetecível para os trabalhadores das pedreiras com mais anos de serviço. No entanto, aquilo que constituiu uma boa notícia para uns, ameaçava ser um pesadelo para outros, nomeadamente, os patrões. A braços com uma crónica falta de mão de obra, as empresas arriscavam-se a perder, agora, alguns dos seus ativos mais importantes já que trabalhadores especializados e com larga experiência é coisa que, por norma, não abunda.

Pouco mais de um ano depois do último dos dois diplomas legais ter entrado em vigor (com efeitos retroativos a janeiro de 2020) fomos tentar saber junto de vários empresários com pedreiras no concelho de Porto de Mós se, afinal, a reforma antecipada destes trabalhadores se tornou efetivamente um problema e como é que estão a lidar com isso.

“Jovens começam a pensar se não será melhor ir para uma pedreira, que continuar a estudar”

Luís Fortunato, da Nalfstone, diz que «esta alteração legal até à data ainda não trouxe problemas à empresa» porque os seus funcionários «estão todos mais ou menos na faixa dos 40 anos», portanto, ainda longe da reforma. O empresário com pedreira no Codaçal (Serro Ventoso) reconhece que algumas empresas irão ter problemas no futuro devido à antecipação da idade da reforma mas, no seu entender, a lei «também há de ter algumas coisas a favor», defendendo que «não se pode ver as coisas só na perspetiva de agora não termos pessoas para trabalhar».

O elemento da gerência da Nalfstone recorda que «são muito poucos os que estão a trabalhar numa pedreira desde os 15/16 anos portanto há pouca gente com possibilidade de se reformar aos 50 anos». Por outro lado, «apesar do trabalho ser duro paga-se bem e recebe-se melhor e há muitos jovens que começam a pensar se não será melhor ir para uma pedreira onde tiram logo 1000 euros ou mais, em vez de andarem a estudar para depois chegarem ao mercado de trabalho e receberem 700 ou 800 euros. Além disso, esta antecipação da idade da reforma pode funcionar como um atrativo», considera.

“Aquilo que é mau hoje pode ser bom no futuro”

Opinião idêntica é a de Rogério Vigário, da Mármores Vigário. «Já tivemos gente da empresa a reformar-se pela nova lei e no primeiro impacto afetou-nos porque é mão de obra que foi sendo qualificada ao longo de vários anos e de um momento para o outro desapareceu. Depois há dificuldade em encontrar pessoal para preencher o lugar porque mão de obra qualificada quase não existe, ou temos de a ir “buscar” ao vizinho ou dar formação mas isso demora o seu tempo e não há muita gente a querer ir para uma área em que tenha de trabalhar a céu aberto», refere.
No entanto, e tal como o seu colega, considera que «se virmos isto numa perspetiva de médio/ longo prazo se calhar a realidade torna-se diferente porque já há muita gente a pensar se vai ou não para uma pedreira porque pode-se reformar-se aos 50 e tal anos quando o trabalhador comum é aos 66 anos e, por outro lado, os salários são bons». «Já tive várias pessoas que me falaram disso, portanto aquilo que agora é mau pode ser bom no futuro», conclui o responsável pela Mármores Vigário, com pedreira (entre outras) na Cabeça Veada.

“Reformas, para já, não têm causado problemas de maior”

A possibilidade de reforma antecipada para as pessoas que trabalham em pedreiras não representa, para já, um problema para a Airemármores. Acácio Cordeiro, o responsável, refere que, «até agora, só houve uma pessoa a reformar-se» ao abrigo do novo diploma legal, tendo sido «um dos primeiros a submeter toda a documentação à Segurança Social», e na equipa só haverá «mais uma pessoa à volta dos 50 anos portanto não estamos muito em risco».

Neste caso, a substituição do trabalhador que se reformou não foi difícil mas Acácio Cordeiro reconhece que nem sempre assim é, já que o setor da pedra é um dos que tem sempre falta de mão de obra. «Num país onde se paga para as pessoas não trabalharem não é fácil encontrar mão de obra. Os jovens são poucos e os que há, emigram. Neste momento talvez pudesse ter mais um ou dois funcionários mas tenho a noção que não é fácil conseguir porque é um trabalho não tanto pesado mas onde as pessoas estão dependentes das condições climatéricas», diz o empresário que resume desta forma um pensamento comum a Luís Fortunato e Rogério Vigário.

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