A casa onde hoje Hugo Brogueira, a esposa e a filha estão a construir memórias é a mesma (ou quase a mesma) onde os seus avós paternos também já tinham criado uma família e vivido toda a uma vida. O simbolismo disto é, para o jovem de 33 anos, do Tojal (onde se localiza a casa), «muito importante». Restaurou esta casa de família onde o «foco da arquitetura foi manter o existente»: «Não só mantive como realcei, piquei o reboco todo em baixo e deixei a pedra à vista, ficou espetacular», explica. E porquê restaurar uma casa antiga? «Já tenho uma filha e precisávamos [Hugo e a esposa] de sair do apartamento onde estávamos a morar e surgiu esta oportunidade. A minha avó já tinha falecido, o meu avô estava num lar e portanto a casa estava inabitada, era uma pena não pegar nela e reabilitá-la», frisa. Por isso, quando estavam à procura de casa para «comprar ou construir», surgiu esta oportunidade.
Mesmo antes de construir as memórias da sua própria família, Hugo Brogueira já tem muitas outras que viveu em pequeno. «Por baixo da casa existe um lagar, a minha família sempre foi produtora de vinho, o vinho Brogueira, e desde pequeno que os meus pais agarraram essa parte do negócio e que eu frequento a casa, quer na altura das vindimas, quer na altura da lagaragem», recorda. Este lagar é ainda hoje uma realidade, sendo esta mais uma das muitas coisas que quis preservar. «Ainda na semana passada descarreguei dois latões de uvas e fiz a lagaragem com o meu pai. O lagar está intacto, mantive tudo, tudo o que se produzia continua-se a produzir», diz. Entre as imagens mais bonitas que ainda hoje guarda, estão também os Natais em família: «O Natal era sempre lá em casa, a noite de consoada, chegava-se a reunir a família toda, o meu pai e a minha mãe, os meus tios da parte do meu pai, sobretudo enquanto fomos pequenos, a partir de uma certa altura os primos mais velhos casaram e isso foi acabando, mas ainda aconteceu até por volta dos meus 20 anos», conta.
O valor de ter “as nossas mãos”
Hugo Brogueira é engenheiro mecânico, mas tem a valência de projeto de estruturas metálicas, o que lhe permitiu estar incluído neste restauro não só de alma, mas também de corpo. «Orientei a obra em conjunto com o meu primo, Gonçalo Brogueira, que é engenheiro civil e tem uma empresa de direção de obra, juntos conseguimos orientar todas as equipas associadas desde construtor, canalização, eletricidade, etc…», esclarece. Além de fazer o projeto, fez, juntamente com amigos, as demolições necessárias e ainda construiu alguns elementos da casa, como por exemplo «um muro de aço leve a sul, um piso em aço leve para aproveitamento de sótão», entre outras coisas. «Basicamente, 80% da casa há-de ter passado por mim, ou em orientação ou mesmo em construção, isso é sempre bom, ter efetivamente posto a “mão na massa” e construir parte da casa», releva.
Entre as coisas que se mantiveram estão as paredes de pedra e as cantarias, mas todas as divisões mudaram de sítio, até porque a casa foi alvo de uma expansão. «Mantive a arquitetura original da parte em pedra e a parte nova foi feita em aço leve, conjugámos o tradicional com a construção moderna», detalha. «Em relação às divisões mudei tudo, não havia grande hipótese de não o fazer, com o avançar dos anos as próprias paredes já tinham algumas rachadelas, depois antigamente as divisões eram muito pequenas, havia quartos de nove ou 10 metros quadrados e todos em fila com um corredor no meio que nos dias de hoje não é o ideal, embora que eles criaram cinco filhos assim tal e qual», brinca. «Tudo o que era paredes interiores da parte original da casa demolimos, desse retângulo da parte original fizemos duas salas e a cozinha, portanto ficámos com uma sala de jantar open space com a cozinha e depois temos ao lado uma sala de estar com uma porta de correr até ao teto, que dá para fechar ou abrir na totalidade, fazendo uma espécie de super open space», pormenoriza.
Além das paredes com anos de história, Hugo Brogueira guardou também alguns elementos e utensílios. «Guardei o cofre dos meus avós que estava no quarto deles onde agora está parte da cozinha, tinha que o tirar da parede para não ficar sem acesso, ainda foram umas três horas que “perdi” a picar pedra e cimento para conseguir tirar o cofre», conta, entre risos. Depois, tudo o são utensílios do lagar, mantém-se os mesmos: «Não os guardei propriamente, porque esses continuam em utilização, são usados todos os anos». Hugo Brogueira tem ainda umas «mesas de jardim tradicionais em ferro»: «Muito engraçadas». Do seu “espólio” faz ainda parte uma peça que os avós tinham «na mesinha de cabeceira com a família toda, eles em cima e depois os filhos pendurados em cada braço da peça».
Nas fotografias que ilustram este artigo está uma das curiosidades desta mudança. Hugo Brogueira e a esposa ainda estavam a remodelar a casa quando a 13 de abril de 2022 a sua filha nasceu. Foram morar para o seu novo lar a 22 de dezembro, «mesmo a tempo de passar o Natal em família». Tal como se recorda em pequeno, este voltou a ser o seu lar na quadra natalícia, onde se quiser poderá dar continuidade às reuniões familiares de consoada, com filhos, netos, primos das gerações que hão-de vir.
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