«Tudo aquilo que a autarquia de Porto de Mós possa fazer pela memória de Silva Marques, faz e faz muito bem porque ele o merece», defendeu o historiador e antigo deputado, José Pacheco Pereira na quinta sessão do ciclo de conferências Ditadura e Democracia: que História? Que Presente? Que Futuro?.
Respondendo ao repto lançado pelo jovem historiador portomosense Kevin Soares, para que partilhasse um pouco do conhecimento e das experiências vividas com o antigo presidente da Câmara de Porto de Mós e mais tarde seu colega no Parlamento, Pacheco Pereira confessou «uma grande admiração por Silva Marques, uma figura ímpar da nossa história democrática», estatuto que, segundo ele, passa pelo facto de o político portomosense já falecido «ter estado sempre entre mundos» ao invés de se ligar a um único grupo.
«Tenho muita estima e saudade do Silva Marques, um homem com uma biografia muito importante, que foi funcionário do Partido Comunista Português (PCP) e meu vice-presidente quando estava à frente do grupo parlamentar do PSD», disse o antigo deputado passando em revista o percurso de José Silva Marques, nomeadamente os tempos em ditadura enquanto funcionário do PCP e depois já em democracia na Assembleia da República.
«Silva Marques tem o melhor livro escrito até hoje sobre o que é a experiência de um funcionário clandestino. Infelizmente nunca foi reeditado, mas é magnífico. É das melhores fontes nessa área e é pioneiro por ter sido dos primeiros. Ele descreve muito aspetos da mentalidade e das vivências em clandestinidade (fala, por exemplo, da grande miséria sexual do viver clandestino) e além do que escreveu contava coisas muito interessantes desse período», disse.
«Ele tinha saídas magníficas. Por exemplo, numa visita a uma cooperativa modelo na União Soviética, o homem da cooperativa, às tantas, apresentou-lhe uma porca enorme dizendo que vencera o recorde da melhor porca socialista ou algo parecido. Resposta do Silva Marques: «Eu já vi algumas maiores na Feira de Santarém…». «Na Assembleia da República, quando alguém se metia com ele, recordava que tinha sido controleiro no PCP e por isso conhecia o seu percurso. Ao Manuel Alegre disse, uma vez, bem disposto: «Ó Manuel Alegre tu até para arranjares uma namorada pedias-me autorização», recordou, acrescentando ao percurso político algumas notas sobre a personalidade e a ação do homem e do político.
«Depois de ter entrado em conflito com o PCP fugiu para França, onde se junta ao grupo esquerdista O Comunista, com o qual se vai incompatibilizar algum tempo depois. Criou um centro de estudos políticos (o Centro de Iniciativa Política) e passou a “social-democratizar-se” e então não é estranho que tenha regressado a Portugal, primeiro como independente e depois como militante do PSD, tendo feito parte da autarquia de Porto de Mós e mais tarde deputado», lembrou Pacheco Pereira, sublinhando que Silva Marques «tinha uma característica de grande coragem política e era aquela pessoa que se oferecia sempre para as coisas mais difíceis», sendo «respeitado e detestado pela oposição».
«Quando houve um conflito grave no grupo parlamentar do PSD, a propósito da questão do Duarte Lima, o Silva Marques foi a peça fundamental porque era, em bom português, um tipo teso. Era muito corajoso. Quando achava que alguém estava a pôr em causa padrões que ele considerava serem padrões morais e de comportamento, só faltava atirar-se-lhe ao pescoço. Em momentos muito duros e muito complicados era uma pessoa com quem se podia sempre contar».
ISIDRO BENTO | texto e foto