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Trinta anos depois, confirmada a ligação subterrânea entre grutas de Mira de Aire e Alcanena

21 Outubro 2023
Bruno Fidalgo Sousa

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Bruno Fidalgo Sousa

21 Out, 2023

De um lado, a Gruta de Moinhos Velhos (Mira de Aire). Do outro, a Gruta da Contenda (Alcanena). Passaram-se mais de três décadas – precisamente 32 anos – até que a Sociedade Portuguesa de Espeleologia (SPE) conseguisse confirmar a ligação física entre ambas. Era uma ambição antiga: desde 1991 que se realizam expedições com esse objetivo, a cada setembro, quando os níveis da água estão mais baixos e é possível passar por alguns sifões que durante o inverno estão submersos. Até agora, a progressão tinha sido residual. Na noite de 28 para 29 de setembro alcançou-se finalmente «um feito bastante emblemático no mundo do mergulho e das grutas»: confirmou-se que é possível para um ser humano fazer a ligação entre as duas grutas. A descoberta resultou em «muito festejo, mas também muito alívio», revela o coordenador da expedição, Ricardo Constantino, que há 14 anos que se aventura no subterrâneo do Maciço Calcário Estremenho. «Não foi fácil», explica, traçando ao nosso jornal um pouco deste jornada que, em suma, veio acrescentar mais 270 metros ao atual sistema Moinhos Velhos – Pena – Contenda , além da topografia de 1020 metros de galerias já exploradas. Uma vitória para a ciência  e para a SPE, 32 anos depois da primeira expedição.

Uma ligação «em duas partes»

Os mergulhos começaram na Galeria do Rio, 200 metros abaixo do nível do solo, num total de quatro. Ao penúltimo, a equipa encontrou «uma pista» que a colocou «no caminho certo»: um simples caderno num sítio onde ninguém tinha estado antes, já que eles tinham sido «os primeiros a lá chegar». «Mas porque carga de água veio um caderno aqui ter?», perguntaram-se os três espeleomergulhadores, o português Ricardo Constantino, o britânico Joe Colls Burnette e a suíça Sabine Sidi-Ali. Na noite dessa descoberta, enviaram fotos aos vários sócios da Sociedade Portuguesa de Espeleologia e encontraram o dono do tal caderno – um mergulhador que explorou a Gruta dos Moinhos Velhos nos anos 90. «Foi o que nos levou a crer que estávamos no caminho certo», explicou a O Portomosense. Afinal, o caderno tinha sido perdido «num ponto bastante longínquo de onde acabou por parar», tendo percorrido «cerca de 800 metros por galerias bastante sinuosas», ao sabor da corrente que os três procuravam acompanhar. «Ou seja, se o fluxo principal da água é por aquele lado, é porque estávamos no caminho certo», diz o também vice-presidente da SPE.

A 22 de setembro, Constantino e Colls Burnette estiveram seis horas debaixo de água, percorrendo cerca de 1000 metros até um poço que pensavam estar imediatamente por baixo da Gruta da Contenda. Ficaram a faltar 22 metros: «Havia ali um estreiteza onde o nosso equipamento e nós próprios não conseguíamos passar», diz o coordenador. Então, deixaram o fio de ariana nessa extremidade, «já a pensar no seguinte mergulho», o derradeiro, a começar pelo lado da Contenda, entre 28 e 29 de setembro. «E com outro tipo de equipamento, mais compacto, conseguimos ultrapassar essa estreiteza e ao fim desses 22 metros estava lá o fio que tínhamos deixado alguns dias antes», explicou.

Para o próximo setembro, já há planos delineados: «Logo a seguir ao jantar de comemoração já estavam as pessoas debruçadas em volta do mapa da gruta para ver onde é que a gente se ia meter no ano seguinte», concluiu, entre risos.

Uma campanha com “objetivos científicos”

Esta campanha deu também para recolher e repor 10 sensores e registadores de temperatura e profundidade em várias grutas do Maciço, com um «objetivo científico»: «perceber a origem das águas, por onde é que elas atravessam e como é que chegam às nascentes conhecidas». «Para tentarmos também conservar esse meio ambiente», diz Ricardo Constantino. Afinal, «conhecendo os percursos da água subterrânea é o que vai ajudar a salvaguardar essa água», que, refere, é «uma das fontes principais de água potável para a humanidade». O presidente do Conselho de Administração das Grutas de Mira de Aire, Carlos Alberto Jorge, concorda: «Esta nova descoberta é de uma importância muito grande para o estudo das águas subterrâneas. Não nos podemos esquecer que estamos assentes no maior lençol de agua doce subterrânea do nosso país».

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