A União dos Agricultores do Distrito de Leiria (UADL) promoveu, no passado dia 25, em Porto de Mós, um encontro com autarcas com o intuito de lhes dar a conhecer a situação em que está a agricultura familiar e pedir apoio para os seus projetos e causas. O convite foi dirigido aos 16 presidentes de Câmara do distrito de Leiria e acompanhado do pedido para que o fizessem chegar também aos presidentes de Junta. Se todos o fizeram não se sabe. Uma coisa é certa: dos potenciais 126 participantes, estiveram apenas 10, sendo Jorge Vala, o único presidente de Câmara presente.
Apesar de poucos, os autarcas procuraram dar sentido ao dito popular “poucos, mas bons”. Durante cerca de duas horas o debate correu animado. Ouviram-se os lamentos mas também os projetos dos agricultores, discutiram-se ideias e todos prometeram ajudar a UADL, sendo voz unânime que «só uma associação forte e ativa é que terá capacidade de se fazer ouvir junto das instâncias de poder e, com isso, lutar por uma agricultura familiar com futuro e que ajude a contrariar a tendência de um meio rural cada vez mais desertificado».
José Alberto Machado, o presidente da UADL, traçou um cenário negro da agricultura familiar afirmando que «está cada vez pior, um autêntico caos» e, António Ferraria, o homem que «há 40 e tal anos» vem lutando por esta causa, ilustrou as dificuldades por que passam os agricultores com um exemplo prático: «O preço do adubo aumentou para mais do dobro, os pesticidas subiram 300%, as rações foram para mais do dobro e o gasóleo agrícola a mesma coisa. É certo que alguns produtos agrícolas aumentaram, mas a subida é insuficiente para contrariar esse aumento brutal do preço dos fatores de produção», frisou. Não sendo possível alterar este estado de coisas, a UADL mostra-se convicta de que pode, pelo menos, tentar minimizar os impactos e «levar a que as pessoas não desistam da agricultura». Uma das formas escolhidas é a venda direta e a preços mais acessíveis, de materiais, pesticidas, rações e outros produtos.
Outra dificuldade identificada é o do escoamento dos produtos, a que se junta a necessidade de mostrar ao consumidor final que o velho lema “o que é nacional, é bom” continua a fazer todo o sentido. Assim, está prevista a realização de uma feira mensal onde os agricultores e criadores de gado possam vender e será organizado um festival gastronómico, em cada um dos 16 municípios, assente naquilo que mais ou de melhor se produz em cada um deles. A iniciativa terá o seu arranque em Porto de Mós (concelho onde a UADL tem a sua sede).
“Pequenos produtores podem vender a IPSS”
Os autarcas aplaudiram e deixaram mais algumas achegas. O representante da Câmara de Leiria disse que «é muito importante criar canais de escoamento de produtos e as feiras são super interessantes para isso». «Muitas vezes queremos comprar e não sabemos que quem está ali ao nosso lado quer vender, então, seria importante que Municípios e Juntas apurassem quem tem para vender e onde estão os potenciais clientes. Dá trabalho mas pode acontecer o que já aconteceu durante a pandemia em que, por exemplo, produtores que vendiam a cafés e restaurantes, com o encerramento do comércio, passaram a vender a lares e outras IPSS», referiu. «Não há nenhuma razão que impeça que um lar possa comprar a fruta ou produtos hortícolas a um produtor da sua terra», sublinhou.
O representante da Junta de Pelariga (Pombal), por seu turno, considerou que há que «trabalhar em rede e fazer parcerias institucionais e comerciais». Por outro lado, e recordando que noutros tempos as pessoas «não passavam recibo nem fatura» mas faziam girar toda a economia local porque depois da venda na feira «passavam pela loja de adubos, pela sapataria e pela mercearia e, no final do ano, compravam um trator», o autarca entende que o futuro passa, em parte, por se recuperar alguma dessa informalidade burocrática e fiscal, assim como uma maior ligação entre o produtor e o consumidor final. «Se olharmos para outros países da Europa, eles já estão a voltar ao ponto de partida e nós temos de lhes seguir o exemplo», disse.
Juntas e Municípios disponíveis para ajudar
Se, por um lado, os autarcas defendem um regresso às origens adaptado aos tempos atuais, por outro, consideram que os agricultores devem estar a par do seu tempo e daí que da parte dos presidentes de Junta de Ferrel e de Pombal tenha vindo o veemente apelo: «A UADL tem de ter um espaço na internet para se dar a conhecer e dizer ao que vem. Quem não está, é como se não existisse», frisou a autarca pombalense, garantindo que «se o problema é falta de material informático ou de quem crie uma página, as Juntas e as Câmaras de bom grado darão a ajuda necessária, basta que peçam». Outra garantia dada por todos é que há abertura para discutir o principal pedido deixado pela UADL, o de haver um espaço físico em cada município e, eventualmente, nalgumas freguesias, que possa servir de apoio à sua atividade.
Interveio também na reunião o presidente da Câmara de Porto de Mós, Jorge Vala, que felicitou a UADL «pela sua persistência e capacidade de resistência», garantindo que é por terem noção disto mesmo e da sua importância na região, que a Câmara, assim como a Junta de Serro Ventoso, têm procurado apoiá-la ao máximo com cedência de instalações, material informático e o estabelecimento de parcerias para que possa levar a cabo os projetos que têm em carteira como a feira e o festival gastronómico.
A importância do setor agrícola e pecuário para o concelho vê-se também, segundo o autarca, no facto de, «em 2023 e pela primeira vez, o orçamento municipal contemplar uma rubrica dedicada à agricultura». Isto acontece também porque «o Município está envolvido, em conjunto com várias entidades, numa candidatura ao PRR, para dar relevo à agricultura de felgar, ou de subsistência, no PNSAC», e porque quer ser parceiro dos agricultores (e das associações de caçadores) na minimização «dos elevados prejuízos que os javalis estão a causar nas propriedades agrícolas».
Fotos | Isidro Bento