“A Batalha de Aljubarrota foi um dos momentos mais marcantes da história de Portugal”

29 Agosto 2024

Luís Vieira Cruz

A importância da preservação da história, da memória, das gentes e dos lugares que estão intimamente ligados aos momentos em que a liberdade de Portugal enquanto estado-nação foi colocada à prova ficou bem patente nos discursos proferidos no dia em que se celebrou no Campo Militar de São Jorge (Calvaria de Cima) o 639.º aniversário da Batalha de Aljubarrota.

As comemorações arrancaram com uma missa campal junto ao monumento evocativo a D. Nuno Álvares Pereira. Uma imponente parada de militares, em sentido e sob uma salva de artilharia, recebeu a seguir o ministro da Defesa, Nuno Melo, convidado a presidir às comemorações. Minutos depois houve o já tradicional momento de deposição de coroas de flores junto à imagem de D. Nuno Álvares Pereira, no qual participaram o presidente da Câmara Municipal, Jorge Vala, o presidente da Fundação da Batalha de Aljubarrota, António Ramalho, o vice-Chefe do Estado Maior do Exército, Tenente-General Maia Pereira, e o ministro da Defesa, Nuno Melo.

Antecedendo a leitura da prece por parte do Capelão Tenente-Coronel Luís Morouço, foram ouvidos três toques: o de sentido à unidade, o de silêncio e o de homenagem aos combatentes que tombaram ao serviço da nação portuguesa. Após a também breve alocução sobre a Batalha, proferida por Américo Henriques, Coronel de Infantaria Comando na reforma, intervieram as várias entidades.

“A ignorância é a pior inimiga da História”

O ministro da Defesa iniciou o seu discurso com uma alusão a um recente episódio que envolveu o Padrão de São Lázaro, em Guimarães: «Este ato de vandalismo ajuda-nos a perceber a importância primordial destas comemorações, que têm que ser repetidas geração após geração. Se o que aqui celebramos recorda aqueles que recusaram vergar-se, morrendo por Portugal, também traduz a obrigação que temos de transmitir o exemplo do seu legado, que deve ser perpétuo», frisou.

Considerando «a ignorância a pior inimiga da História e da essência de uma nação», Nuno Melo vincou também a necessidade de se explicar às novas gerações que a vitória que ocorreu «neste chão sagrado foi um dos acontecimentos mais marcantes da história de Portugal». «Aljubarrota traduziu a derrota definitiva dos castelhanos, o fim de uma crise dinástica, a afirmação de D. João I, Mestre de Avis, como rei de Portugal, e marcou também um tempo glorioso da história nacional, os Descobrimentos», recordou.

Não alheio ao facto de discursar diante de várias centenas de militares, Nuno Melo aproveitou para a eles se dirigir, dizendo que tanto o contingente no ativo como aquele que já serviu o país se encontram no topo das suas prioridades: «Somos legatários de um passado que temos que honrar e é por causa disso que decidimos pelo aumento de salários com suplementos, que são históricos para os militares do presente, e novos apoios na saúde para os antigos combatentes», vincou.

Um campo militar com características singulares

Depois de uma breve resenha histórica, o presidente da Câmara de Porto de Mós centrou a sua atenção no presente e no futuro do Campo Militar e da população de São Jorge. Descartando levar para “cima da mesa” as «batalhas políticas» que o século XXI viu serem travadas sobre aquele lugar, Jorge Vala aproveitou para destacar as características únicas do espaço que a 14 de agosto de 1385 virou um sangrento campo de batalha. «Trata-se de um dos raros campos de batalha medievais cuja localização é conhecida com bastante rigor. É pois nosso dever salvaguardar este lugar, dignificar o seu caráter identitário, justificativo da sua classificação como monumento nacional», referiu. E precisamente por constatar que esta batalha medieval não deixou marcas profundas na paisagem, disse entender que «olhares menos experimentados perguntem o que há a salvaguardar». Para esta questão, antecipou de pronto a resposta: «É um legado diverso, feito de ciência, cultura, simbolismo, território, imaterialidade, economia e de gentes. Do povo». Para o líder autárquico, o valor do conhecimento científico poderá esconder-se «em algumas zonas deste subsolo que nada mostra», mas que «tem que ser salvaguardado para que o mito e o desconhecido cedam lugar ao conhecimento histórico».

Município promete não falhar com a Capela

Referindo-se depois à Capela de São Jorge, monumento nacional que há pouco passou para a égide do Município, Jorge Vala garantiu que não falhará «na missão de restaurá-la e de integrá-la num circuito dinâmico de mediação cultural». Na mesma onda, abordou o futuro da antiga Estrada Real: «Este eixo explica igualmente a história deste lugar e nele queremos inscrever valores rememorativos e de qualidade urbana para toda a comunidade. Valores que solidarizem o passado, o presente e um futuro que se deseja venturoso».

Pedem-se metas para “desbloquear” São Jorge

Consciente dos valores económicos, culturais e sociais inerentes a este território, o responsável autárquico defendeu que «uma estratégia de valorização que conjugue todos estes fatores só pode beneficiar os fundamentos da classificação, a recuperação da paisagem histórica e a qualidade de vida de quem nela vive», porque, salienta, «São Jorge também é feito de gente». Enquanto não se quebrar «o limbo em que o património e a comunidade se encontram» por falta de «instrumentos eficazes de valorização do monumento e sem perspetivas de desenvolvimento coerente para a localidade», o futuro de ambos é posto em causa. Por esse motivo, Vala afirmou que «é preciso que o Estado assuma de forma inequívoca que modelo pretende para o património, que o discuta e que o afira com as autarquias e com a comunidade, com a Fundação da Batalha de Aljubarrota e que se comprometa em estabelecer metas concretas».

Uma batalha que mudou o mundo

Além de ministro da Defesa e presidente da Câmara, subiu ao palanque, na qualidade de anfitrião, o presidente da Fundação Batalha de Aljubarrota. As suas palavras foram maioritariamente evocativas do feito dos comandados por D. Nuno Álvares Pereira, que se agigantaram contra a armada castelhana. Recuperando detalhadamente o dia do combate, o responsável destacou que a Batalha «foi um elemento decisivo para a nossa nacionalidade». «A contenta entre países vizinhos durou uma hora, mas que hora durou», exclamou. Tivesse o resultado sido diferente, Portugal seria possivelmente uma simples autonomia ibérica, segundo Ramalho.

«O mundo mudou naquela hora. Por isso, numa época em que alguns procuram reservar discussões sobre o passado à luz de conceitos da moda e que se dedicam a contabilizar indemnizações entre países, continentes e culturas, nós, na Fundação, seguindo o espírito do nosso fundador, António Champalimaud, e do nosso primeiro presidente, Alexandre Patrício Gouveia, queremos não só mostrar Aljubarrota a cada português, mas ao mundo».

Após o período de discursos, a celebração do aniversário continuou com a recriação histórica da Batalha de Aljubarrota, cuja organização esteve sob a alçada da Companhia Livre. A comitiva visitou de seguida o Centro de Interpretação da Batalha de Aljubarrota, onde também almoçou, e seguiu, de tarde, para o Mosteiro de Santa Maria da Vitória, onde visitou Túmulo de D. João I e tomou parte nos restantes atos evocativos com que habitualmente terminam as comemorações conjuntas entre Porto de Mós, Batalha e Fundação Batalha de Aljubarrota.

Fotos | Luís Vieira Cruz

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