Crónicas do Admirável Mundo Novo – A Felicidade é uma forma de Resistência

3 Novembro 2025

Sendo filho da Revolução de 25 de Abril, que instaurou esta Democracia em falência que vivemos, interessei-me pelo conceito de “Revolução”, tanto quanto pode levar qualquer espírito jovem (apaixonado pelos momentos que a vida dá) a debruçar-se sobre um tema. Com os anos, contudo, entendendo a multiplicidade do mundo e as causas onde cada evento nasce e efeitos que cada ação faz ecoar, procurei entender o contexto que a essa revolução conduziu. Debrucei-me assim sobre o conceito de “Resistência”; aquela a que uma minoria de cidadãos se dedicou desde a instauração do Estado Novo em 1926; culminando nas multidões que ocuparam as ruas, sem medo, com os militares revoltosos comandados por Otelo Saraiva de Carvalho.

Nos dias em que as massas abusam da palavra “Resiliência”, movidas pelas forças pós-pandémicas, que insistem que “o povo é sereno”, substitui-se muitas vezes de forma errada a “Resistência” pela “Resiliência”. A ver:

“Resistência”, dentro de várias explicações possíveis, de acordo com cada contexto, é grosso modo a capacidade de um elemento resistir a uma força contra ele aplicada. “Resiliência” refere-se à capacidade de retornar ao normal depois de submetido a uma tensão.

Efectivamente, os mass media e as contas falsas nas redes sociais, procuram convencer-nos que nos encontramos a retomar ao “normal” e não a resistir a uma força que nos oprime. Parece que essa troca não é importante, mas se a ideia de que resistimos se apaga, ficamos submersos na aceitação deste “vale de lágrimas”, sempre esperançosos de que rumamos no sentido certo. É um erro.

Em tempos de a mortalidade infantil aumentar no nosso país (estávamos no top 20, a nível mundial, da menor mortalidade); do aumento dos sem-abrigo; do aumento da criminalidade violenta; do aumento das assimetrias entre ricos e pobres; do aumento de impostos; da dificuldade crescente em ter uma qualidade de vida, que nos prometem todos os partidos a cada eleição, uma esmagadora maioria deste país é Resistente e não Resiliente.

De qualquer forma, devemos ser optimistas. Gilles Deleuze – filósofo francês – dizia que “a Felicidade é uma forma de resistência”. Basta ver a resistência da felicidade das festas nas comunidades mais pobres; os bailes das festas das paróquias em Portugal, ou as conversas entre amigos nos cafés e nas ruas. Eu, respirando fundo o ar da Serra dos Candeeiros, lembro as palavras de Arthur Rimbaud, na tradução de Mário de Cezariny: “Isto começou com risos de criança. Isto vai acabar numa debandada de perfumes”. Hei de ser feliz na adversidade, na “Resistência” crítica à ideia de “Resiliência”.