A dicotomia da relação entre o Parque Natural e as populações residentes é um assunto que acompanho com alguma proximidade há muitos anos. A recente multa de 12 mil euros aplicada à junta em Alvados por parte do ICNF (Instituto da Conservação da Natureza e das Florestas), por ter limpo um caminho que estava intransitável é o exemplo mais recente.
De um lado temos uma estrutura nomeada, cega e sem cara, representada por camadas de burocracia, por taxas e taxinhas, por pareceres e autorizações. E do outro temos uma junta de freguesia que é a entidade mais próxima das pessoas, devidamente mandatada e eleita por estas para defender os seus interesses.
O Parque Natural das Serras de Aire e Candeeiros (PNSAC) é gerido pelo ICNF, cuja estrutura atual resulta da aglomeração em 2012 de um conjunto de entidades e tem «a missão de contribuir para a valorização e conservação dos aspetos relativos aos recursos florestais e à Natureza e Biodiversidade em Portugal».
Estaremos de acordo de que estes objetivos são nobres e alinhados com uma sociedade moderna em que a proteção ambiental deverá estar na ordem do dia.
Importa relevar também que a manta de retalhos administrativa que é hoje o ICNF, foi “costurada” na altura da “troika”. O objetivo era reduzir o número de entidades públicas, mesmo com prejuízo para a funcionalidade e objetivos de cada uma.
Entre as atribuições do ICNF está a gestão da Rede Nacional de Áreas Protegidas, das matas nacionais e dos perímetros florestais. Está também a execução das políticas nacionais de conservação da natureza e da biodiversidade, das florestas, da caça, da pesca nas águas interiores e do combate à desertificação.
Aqui existem funções e atribuições distintas que nem sempre têm os mesmos objetivos. O planeamento florestal nem sempre estará alinhado com a “conservação da biodiversidade” (no sentido lato do termo), por exemplo, tal como aconteceu em Alvados.
A proibição de circulação de veículos motorizados no polje em Mira de Aire é outro exemplo. O objetivo principal seria a preservação dos caminhos existentes mas o resultado mais visível é o crescimento do mato nos caminhos, dificultando a circulação. A passagem responsável de pessoas e veículos mantém os caminhos transitáveis e permite que estes sejam usados numa emergência (fogo florestal). Agora, para limpar estes caminhos, a junta terá que obter o parecer do ICNF ou sujeitar-se a uma multa.
A política da proibição cega, da introdução de burocracias e dificuldades contribui apenas para afastar a população.
Sem pessoas, dificilmente temos conservação! As populações não podem ser encaradas como inimigo e devem fazer parte da solução.
O “P” adicional que introduzo no título refere-se a “Pessoas” para que estas sejam tidas em consideração como fazendo parte ativa de uma estratégia verdadeiramente sustentável para a conservação da natureza: “O Parque Natural, para as Pessoas, das Serras de Aire e Candeeiros”.