Três meses depois de ter aberto, em Alfama, as portas do Casa Tradição, «um projeto há muito ambicionado», Samuel Mota ainda a viver a adrenalina e o entusiasmo inicial que a criação de um novo espaço pressupõe, viu-se obrigado a encerrar portas por causa da avalanche provocada pela COVID-19. «Para a idade que tinha, o restaurante estava a funcionar muito bem. Tínhamos dias consecutivos cheios e estava a ser muito bom», recorda o chef natural de Porto de Mós. Estávamos em março de 2020 quando o pesadelo bateu à porta e o apanhou completamente desprevenido, deixando-o sem capacidade de reação. «Foi difícil. Nós ainda estávamos a definir tanta coisa que ficámos tão apreensivos, tão colados ao que tinha acontecido que não conseguimos reagir, só quisemos parar», conta.
O interregno durou praticamente todo o confinamento. Com uma empresa «muito frágil» ainda a suportar o «peso de todo o investimento», as sete pessoas que inicialmente compunham o projeto, ficaram reduzidas a duas. A dias do primeiro desconfinamento começaram a pensar qual seria a melhor solução e chegaram à conclusão que dada a localização do Casa Tradição, o serviço de take-away ou entrega de comida através de empresas de entrega ao domicílio não era viável. «O turismo e o alojamento local invadiram o bairro e nós não tínhamos moradores para nos dar o conforto de take-away», lamenta. Apesar de todos os entraves, a equipa decidiu arregaçar as mangas e como medida alternativa apostou em receitas para serem comercializadas ultra-congeladas e finalizadas em casa. Foi assim que nasceu o projeto Em sua casa, tradição.
Mesmo admitindo nunca ter tido a experiência de vender comida online durante toda a sua carreira profissional, o chef decidiu arriscar e dedicar-se a confecionar rissóis, empadas e croquetes. Acreditava tratar-se de um «negócio rápido», não fosse o facto de este ser um tipo de comida bastante «conhecido do povo». Samuel Mota não podia estar mais certo. Assim que publicitaram a venda, receberam logo um «feedback espetacular», principalmente vindo de Porto de Mós, um dos pontos de recolha, juntamente com Batalha, Nazaré, Alcobaça, Leiria e Lisboa. «Tenho muita gratidão aos portomosenses, que me deram a mão e começaram logo a comprar», frisa. Nessa altura, o cozinheiro contou com o apoio imprescindível de amigos e familiares. «Tivemos sempre alguém que nos levou os produtos para Porto de Mós e a minha família conseguiu ajudar-me na distribuição», explica.
“Uma nova forma de fazer take-away”
Por altura do Natal, a equipa do Casa Tradição quis ir «mais além», tentando ir ao encontro daquela que é a imagem do restaurante: cozinha portuguesa com um toque de autor. Foi criada uma loja online, onde constam refeições embaladas a vácuo e ultracongeladas, desde entradas, pratos principais a sobremesas. Todas as refeições já estão previamente cozinhadas, sendo apenas necessário finalizar em casa. Uma tarefa «rápida e simples» que na maior parte das vezes não excede os 15 minutos. Apesar da simplicidade do processo, a encomenda é acompanhada de um guia escrito onde são explicados todos os passos. Na panóplia de opções surgem produtos frescos ou congelados, com validade de «15 dias e três meses», respetivamente. O objetivo é claro: «As pessoas serem um chef em casa e poderem partilhar bons momentos em família», sem que isso acarrete muitas preocupações.
Aquela que é vista pelo chef como uma «nova forma de fazer take-away», não é nada mais, nada menos do que aquilo que é feito hoje em dia num restaurante. «O processo dos produtos que estamos a vender no site é o processo que acontece no backstage de um restaurante. Em 90% dos restaurantes de profissionais é assim que funciona», garante. Apesar de não esconder que este tipo de negócio é mais rentável, se compararmos com o projeto anterior, o chef Samuel Mota admite que foi a vontade de querer dar uma «melhor experiência» às pessoas que o fez lançar-se nesta nova aventura. «É uma refeição mais completa e tem mais um toque de chef», sublinha.